quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

O Menino, a Toupeira, a Raposa e o Cavalo. E se um livro por dia fôr uma vacina contra a pandemia?

13. O Menino, a Toupeira, a Raposa e o Cavalo | Charlie Mackesy | Suma de Letras

Antes de chegar a Portugal, já lhe conhecíamos a fama de apaixonar milhares de leitores de todas as idades. Quando, finalmente, o tocamos e abrimos, não conseguimos deixar de pensar que entendemos o porquê. É um daqueles  livros. Único. Singular. Para ler e reler. Muitas vezes. Para retornar vezes sem conta. Traz-nos à memória Winnie the Pooh. De certo modo, também O Principezinho. Mas a única certeza que nos deixa é que viverá em cima da nossa mesa de cabeceira por muito tempo.

Não é um típico álbum ilustrado, mas nasceu de uma ilustração partilhada entre o autor e os seus seguidores nas redes sociais, num momento em que perdera um amigo. Não é uma típica narrativa de acontecimentos, mas fala de amor, de amizade, de esperança, de bondade, de coragem.


Nas palavras do seu autor, o britânico Charlie Mackesy, é  uma pequena novela gráfica, feita de ilustrações e diálogos, com uma paisagem em fundo". Para nós, leitores, é o retrato de um mundo onde todos queremos viver. É nele que se encontram um menino curioso que quer chegar a casa, uma toupeira gulosa, uma raposa silenciosa e um cavalo sábio. Quatro amigos improváveis? Não, aqui é um lugar onde o improvável não existe. Os laços fortalecem-se e os quatro encetam uma inesquecível viagem, deambulando pelos caminhos da vida. E contemplando a natureza selvagem, que é assim um pouco como a vida - assustadora, por vezes, mas bela. São todos diferentes, mas  cada um pode bem ser uma parte de nós.


As aventuras destes amigos acontecem na Primavera, quando, num momento, a neve cai e, a seguir, o sol brilha, o que se parece um pouco com a vida : é capaz de dar uma reviravolta num abrir e fechar de olhos.
Os diálogos são curtos, mas deleitam leitores de todas as idades.  Giram em torno do sentido da vida. Das grandes questões que, tantas vezes, nos assolam. São sobre cada um de nós. As nossas qualidades, as nossas imperfeições. Refletem os medos, as inseguranças, as interrogações de cada um dos quatro amigos. Espelham as respostas que o amor crescente entre todos lhes vai dando.





- "O que queres ser quando cresceres?"
- " Bondoso", disse o menino.
- "Para ti, o que é o sucesso?" perguntou o menino.
- "Amar", disse a toupeira.
-"Qual foi a coisa mais corajosa que alguma vez disseste?", perguntou o menino.
- "Socorro", disse o cavalo.







































As imagens, com traço de menino, são  desconcertantemente belas. Para quem, como nós, é amante incondicional de Winnie the Pooh, é impossível não nos lembrarmos das ilustrações de E.H.Shepard.  Mackesy refere que os diálogos são inspirados em conversas que foi mantendo com alguns dos seus amigos. Talvez essa seja a razão para nos tocarem tão profundamente. Muito se poderia dizer deste livro poético, sensível e delicado. Mas, na verdade, ele não é  descrítivel. É necessário tê-lo nas mãos. Para o ler. Para o contemplar.







































A nossa sugestão é que conheçam de perto esse menino curioso que precisa ser amado, a toupeira gulosa mas bem corajosa, a raposa cautelosa porque a vida a magoou e  o sábio cavalo. Tão sábio  que sabe voar. Mas não voa porque os outros cavalos ficam com inveja. 
Abram as asas e comecem a voar. Passeiem-se com as crianças por aqui. Ou sozinhos. Façam amigos e sonhem. Este é um lugar de todos os sonhos.


Hipopómatos em Festa! A nossa Casa nasceu há 5 anos

Há 5 anos, nascia a Casa dos Hipopómatos. Este fim de semana, queremos celebrar com vocês. Estaremos abertos sábado e domingo, das 10:00 às 19:00H. Com muitas surpresas, iguarias e preços de aniversário. Festejamos em segurança. O aquecedor de rua vai animar a festa ao ar livre. Distanciados, mas juntos, o bolo de aniversário espera por vocês às 17:00. Sábado e domingo. E nós esperamos pelo vosso carinho.  

Ilustração de Catarina Correia Marques.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2020

Bom Fim de Semana

Freya Blackwood


It isn't Rude to be Nude. E se um livro por dia fôr uma vacina contra a pandemia?


 12. It isn't Rude to be Nude | Rosie Haine | Tate

A nossa sugestão de hoje é um livro que ainda não chegou a Portugal, mas que muito gostaríamos de ver por cá! O selo aposto na capa não deixa margem para dúvidas: Contains nakedness - and that's ok.

A capa do livro, sem necessidade de qualquer imagem, vale por si. Quando o abrimos, sabemos de imediato que este é um lugar onde se celebra a nudez, a diferença, a beleza. Um desfile de maravilhosos desenhos de corpos. De todas as formas e tamanhos. De todas as cores e idades.

Com uma inesperada simplicidade, o livro surge como uma espécie de manual de corpos humanos onde parecemos estar todos retratados. Todos iguais, todos diferentes. 

De diversas formas, Haine diz-nos que todos os corpos são bonitos, independentemente do seu aspecto. Que interessa a idade, o peso, a forma? Será sempre o teu corpo.















O envelhecimento é inevitável. Os sinais começam a aparecer. Algumas coisas mudam mais rapidamente do que outras. Mas há as que nunca mudam. Afinal, todos temos rabo e mamilos.  A nudez nunca será feia.















Esta é uma deliciosa abordagem de uma temática tantas vezes ocultada às crianças. Este é o lugar certo para entrar de mãos dadas com elas,  deixem as roupas e as ideias pré-concebidas à porta. Aqui, facilmente, nos encontramos. Elas identificarão amigos, pais, avós... numa celebração do respeito pelas diferença. 
















No seu álbum estreia, Haine deslumbra leitores de todas as idades. Os desenhos com que nos brinda são intensos, simples, belos, verdadeiros. Como é a própria nudez. 

quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

Pokko e o Tambor. E se um livro por dia fôr uma vacina contra a pandemia?

 11. Pokko e o Tambor | Matthew Forsythe | Orfeu Negro

Nem sempre é fácil os pais reconhecerem os seus erros, mas esse não é, definitivamente, o caso dos pais da Pokko. Esta é uma simpática família de rãs que vive num cogumelo de fazer inveja a qualquer um. Compreensivelmente, o que menos precisam é de chamar a atenção de terceiros. Mas quando há filhos em casa é preciso entretê-los e a Pokko não é excepção. A verdade é que nem sempre se acerta e a oferta de um tambor à pequena não terá sido a decisão mais sensata. As coisas não tinham corrido bem anteriormente quando tinham cedido com a  fisga, o lama, o balão... mas nada que se comparasse ao tambor! Pokko tamborilava dia e noite, a torto e a direito. Desta feita, o pai não tinha dúvidas. Este era o maior erro de todos. A mãe não se mostrava tão segura, mas todos sabemos que  quando se lê avidamente um livro nem sempre somos os melhores ouvintes do que se passa lá fora... 

Esta é uma história divertida e hilariante, não sendo necessário avançar muitas páginas para que pequenos e grandes leitores criem uma forte empatia com a família. Pouco tradicional, acrescente-se.  O pai é rei na cozinha e o resto da casa também aparenta ser ser por sua conta,  já que à mãe não parece sobrar muito tempo da sua actividade de leitora compulsiva. 

Depois de uma conversa com o pai, a pequena Pokko revela-se compreensiva  sobre a necessidade de  se afastar um pouco de casa. Acaba por se embrenhar na silenciosa floresta, onde tamborilar é quase imperioso para não se sentir sozinha. Subitamente, Pokko tem atrás de si uma banda e uma multidão que só quer celebrar e festejar a vida.  A pequena rã revela-se uma chefe da banda de grande gabarito. Não só pelos dotes artísticos mas também pela maturidade e 
coragem com que impõe a sua liderança. Porque foi ela que pôs o lobo em sentido! Ali na floresta, num momento difícil da história em que o lobo decide comer o coelho, Pokko enfrenta-o sem hesitações : Comes mais alguém e sais da banda!

As ilustrações de Forsythe seduzem os leitores do princípio ao fim do livro. A paleta de cores, a maravilhosa representação dos espaços interiores onde apetece morar, a floresta onde queremos entrar... são detalhes que tornam a história num verdadeiro colírio para os olhos.  Uma história em que não chegamos ao fim sem nos lembrarmos de Jon Klassen e do seu Este Chapéu Não é Meu. Não só pelo momento de reviravolta em que o lobo come o coelho mas também pelas semelhanças de cenário em que o mesmo ocorre.

Vão até lá e descubram como acaba o passeio da Pokko pela floresta! Ela bem merece que apreciem a sua arte. Até o pai já se rendeu. A mãe? Só mesmo vendo! 
Em tempos de pandemia, bem precisamos de música e alegria. Levem as crianças e juntem-se à festa! 
Por tudo isto, hoje não podemos deixar de sugerir que este Natal ofereçam Livros e Tambores!

segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

Sayid Manuel. E se um livro por dia fôr uma vacina contra a pandemia?

10. Sayid Manuel | Catarina Gomes | Trinta Por Uma Linha

Sayid é um gato com 15 anos de idade, muitos quilos e várias manchas brancas, ainda que tenha nascido todo preto. A dona, a ilustradora Catarina Gomes, achou que a sua vida dava um livro e o bichano não parece ter-se feito rogado. Em jeito de biografia ilustrada, Sayid Manuel conta-nos a longa e recheada vida de bichano no seio da família que o escolheu. Uma história cheia de humor, onde as imagens predominam e em que, facilmente, reconhecemos o estilo da autora das Ideias Despenteadas. O livro encantará, certamente, todos os amantes de gatos, mas não só. Desde que habita por aqui que é bem manuseado pelas mãos dos mais pequenos que não resistem a pronunciar vezes sem conta o nome do felino. 

O relato de vida remonta ao dia em que se conheceram e a dona formulou um sem número de perguntas e outras tantas dúvidas na loja dos animais. Sayid recorda a viagem até casa, a chegada e as dificuldades iniciais da adaptação. 

Dois meses volvidos, já se tornara o rei da casa e dominava o território como as palmas das suas patas. O diospireiro para lanchar, o muro para se exibir, o matagal onde se podia esconder, os telhados onde cuscava o mundo... o novo habitat deixara de ter segredos. A vida corria bem ao gato também chamado de Pata Lenta, Pança Mansa, Lord Nelson e muitos outros nomes que a imaginação da dona lhe atribuía amiúde. Dono de certo peso, o lorde gostará de poucas coisas na vida como de comida. A prová-lo está a pergunta frequentemente feita aos donos : A gata está prenha? 

Mas, a vida (ou vidas) de Lord Nelson não se resume aos pitéus. Nem poderá dizer-se que tenha sido sempre um mar de peixes... As espinhas, ou melhor, os espinhos, também fazem parte. Para trás, fica o dia em que mudaram de casa. O dia em que, certamente, terá experimentado as mais sérias dificuldades em conhecer a mente dos humanos. Uma nova casa? Sem quintal? Sem diospireiro? Sem aventura? Sem a Bonita, a gata da D. Belmira? Os donos, sempre atentos e preocupados, bem tentaram compensá-lo com algumas mordomias e luxos, mas Sayid Manuel recusou sempre trocar a sua liberdade por essa vida aburguesada... stress foi tanto (opinião avalizada do veterinário) que no seu pelo preto começaram a aparecer as manchas brancas que ainda hoje o tornam diferente. As mudanças não se ficariam por  aqui, recordando bem o dia em que viu chegar a Tartaruga Faustino, com quem passou a partilhar o espaço e as atenções. Não se iludam, o pior ainda estava para chegar. Uns meses mais tarde e sem perceber muito bem porquê, começou a ver o espaço no colo da dona a diminuir... Algum tempo depois, deixou de ser o rei da casa. Não foi fácil. Engordou, fiou deprimido, isolou-se, chamou a atenção das várias maneiras que conseguiu... Hoje, já se habituou. Partilha a casa nova e o amor de todos os que nela vivem, exibindo a sua longevidade, a sua pança mansa e as suas manchas brancas que já lhe granjearam a alcunha de The Special One.


quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

Caça-Olhares. E se um livro por dia fôr uma vacina contra a pandemia?


 9. Caça-Olhares | Marina Núñez e Avi Ofer | Kalandraka

O título caça a atenção e a curiosidade do leitor. Um olhar mais atento traz-nos à memória o universo de Quentin Blake.  As semelhanças são incríveis, mas este é um livro ilustrado  pelo israelita Avi Ofer que, para além de ilustrador, é também um premiado realizador de filmes de animação. Esta é uma deliciosa e divertida abordagem à temática sempre actual do uso (e abuso) que damos aos dispositivos móveis. 

Telemóveis, iPads, televisão...  A Vera já não aguentava tanta concorrência! As pessoas, à sua volta, viviam com os olhos colados àqueles ecrãs.  Em casa, já não sabia o que fazer para chamar a atenção da família. Na rua, raramente conseguia um olhar da multidão com que se cruzava.  E se os adultos não paravam, nem para observar as coisas maravilhosas que há no mundo, como poderia querer que olhassem para ela? Mas a garota não se conformava. Afinal de contas não era invisível. 

Determinada e munida dos instrumentos necessários para caçar olhares, a Vera decidiu pedir ajuda à única pessoa que sabia ser capaz de a ajudar a encontrar uma solução, a avó. Com ela, tudo era diferente. Mesmo dizendo que já não via lá muito bem, tinha sempre olhares para ela. Podia já não ouvir como dantes, mas não deixava de escutar todas as suas histórias. A avó Guida nunca tinha pressa nem mil e uma coisas para fazer. Desabafadas as preocupações da neta, foi com grande naturalidade que as duas passaram a tarde juntas a arquitectar um plano para acabar com a situação que tanto angustiava a nossa protagonista.

E cada segundo valeu a pena! O  jogo que inventaram acabou cativando quem por elas passava. A Vera pode voltar para casa com a sua rede cheinha de olhares. E, para sua surpresa, depois de ter contado aos pais o dia maravilhoso que ela e a avó tinham feito acontecer, o "milagre" aconteceu. Também  ali a menina pôde receber o que tanto precisava. Olhares e abraços. Uns e outros tão necessários nos dias que correm. Não deixem de aplicar o tratamento às vossas crianças! 
Com uma paleta de cores suave, as ilustrações em jeito de esboço articulam-se na perfeição com o texto curto e direto. O humor, comum a ambas as narrativas, contagia pequenos e grandes leitores. 

Este é um livro que conhecemos antes mesmo de nascer. Caça-Olhares foi uma obra finalista do XII PRÉMIO INTERNACIONAL COMPOSTELA, cujo júri tivemos o prazer de integrar. Na altura, ninguém lhe ficou indiferente. Hoje, também não. Ficamos imensamente felizes de o ver chegar e andar por aqui a encantar todos aqueles a quem caça o olhar. A nossa sugestão é que larguem os vossos ecrãs, agarrem nas crianças e experimentem o jogo da Vera e da avó Guida! E não se admirem se acabarem todos numa guerra de almofadas aí por casa...
AVISO: Os adultos podem ficar chocados por se sentirem retratados nesta obra.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

Síul, Epilif e o Grande Zigomático. E se um livro por dia fôr uma vacina contra a pandemia?

8. Síul. Epilif e o Grande Zigomático | Nuno Artur Silva e Pierre Pratt | Bertrand Editora

Nunca a palavra saudade foi tão pronunciada como nestes tempos que vamos vivendo. Temos saudades da família e dos amigos. Do convívio. Dos abraços. Temos saudades de partilhar momentos, conversas, leituras...de tomar um copo, um café, de jantar. E que dizer dos mais pequenos? Vivenciando dias estranhos, sentem saudades de brincar sem restrições. Porque as crianças brincam agarrando-se e  tocando-se. 

A nossa sugestão de hoje é uma magnífica história de amizade.  À primeira vista, uma amizade improvável entre dois miúdos que, aparentemente, teriam pouco em comum. Mas não são essas as mais duradouras?

Luís era um miúdo com uma particularidade. Não ria. Nunca! Os pais já o tinham levado a um sem número de médicos e o rapaz já tinha feito uma parafernália de exames e respondido a muitas perguntas. Todos eram unânimes. O Luís não tinha nenhuma doença. Não havia nada de errado com a parte de fora dele, nem com a parte de dentro. A verdade é que o Luís gostava de brincar, de saltar, de jogar à bola, de ler, de ver desenhos animados... Tudo como as crianças da sua idade.  Apenas não se ria. Nunca.

     

Os amigos bem tentavam. Faziam palhaçadas, davam puns, diziam toda a espécie de piadas que a imaginação lhes permitia... Os pais mostravam-lhe cenas cómicas, as coisas mais malucas... Nada. O Luís não se ria. Nunca. E ninguém percebia porquê. Um dia, o Luís conheceu o Filipe e tornaram-se inseparáveis. Ao contrário do Luís, o Filipe ria muito. Por tudo e por nada. Passaram a andar juntos por todo o lado, mas um nunca ria e o outro estava sempre a rir. O primeiro gostava do espaço, dos cometas, das estrelas. O segundo era apaixonado por magia e, embora falhasse os truques todos, persistia no sonho de ser mágico. Um dia seria o Grande Epilif. Lógico, que era uma palavra que o Filipe gostava muito de dizer.  Ainda que bem diferentes, os rapazes tornaram-se amigos. Entre eles deixou de haver segredos e embora o Filipe também não percebesse porque é que o amigo nunca se ria, isso não constituía qualquer entrave à sua amizade. Bom, ele também não sabia explicar porque se ria tanto. A cumplicidade era grande e a curiosidade de ambos também. O Luís falava sobre o espaço, o Big Bang, os cometas e o amigo até fazia algumas perguntas... O Filipe ensaiava vezes sem conta  os seus truques de magia. Daquela cartola não saíam coelhos, mas o amigo era um espectador assíduo. 

Até que um dia, a magia aconteceu mesmo. O Grande Epilif conseguiu tirar da cartola não um, não dois coelhos, mas sim um cão! Um cão verdadeiro, pasmem! Não acreditam? O Luís também não queria acreditar e o espanto foi tal que começou a rir... E os dois até descobriram que tudo se ficou a dever ao Grande Zigomático, o músculo que nos faz rir. 
Uma história divertida, com um texto fluído e cheio de humor a que as  magníficas ilustrações de Pratt conferem um brilho acrescido. Espraiando-se pelas duplas páginas e obtendo um sóbrio equilíbrio com as palavras, são elas que dão ao leitor a medida do crescimento desta bonita amizade. Com a grande cidade como cenário, o ilustrador escolhe a montanha como símbolo do refúgio dos dois amigos. O lugar onde desvendam segredos e multiplicam  cumplicidades. Somos fãs do seu trabalho e ficamos felizes sempre que vemos chegar, aqui em Portugal, um livro ilustrado por si.
Agarrem nos miúdos, apresentem-lhes o Epilif e o  Síul, assistam a alguns truques de magia e preparem-se para umas boas e sonoras gargalhadas. Tudo, por conta do Grande Zigomático. Lógico. Afinal, tudo o que mais precisamos nestes dias. Bem vos dizemos que um livro por dia...


quinta-feira, 26 de novembro de 2020

O Gnu e o Texugo. E se um livro por dia fôr uma vacina contra a pandemia?


 7. O Gnu e o Texugo, Cuidado com o Vento | Ana Pessoa e Madalena Matoso | Planeta Tangerina

Que história é esta? Um gnu e um texugo? Empurrados pelo vento? O quê? Este livro também? Andou às voltas e ficou todo baralhado? Mas que história tão fantástica!
Somos fãs da coleção mini-micro  do Planeta Tangerina. E andamos tão encantados com esta história que não há ventania que nos faça perder de vista o gnu e o texugo. De pequeno formato, com um título divertido e intrigante e uma capa deliciosamente apelativa, gostamos dele mesmo antes de o abrir. Mas quando o fazemos, ficamos por lá um tempo sem fim. O texto de Pessoa é uma deliciosa  brincadeira e as ilustrações de Matoso são desconcertantemente bonitas. Pequenos quadros que podemos ver com as crianças como se deambulássemos por uma exposição.
Um hino à criatividade, esta história acaba no meio do livro. A culpa é do vento. Mas depois recomeça. Toda baralhada.  A culpa também é do vento. Mas que grande trapalhada! Agora, o texto está trocado, as ilustrações também, as páginas... O pinheirinho todo torto bem avisou, mas ninguém lhe deu ouvidos.




























O início da história não podia ser melhor.  Adivinha lá quem andava ali a passear
Mas entre miúdos e graúdos, alguém se atreve a não adivinhar que era  um gnu muito elegante com o seu chapéu azul? O mesmo gnu que não ouviu o aviso e, como era um grande cabeça de vento, foi levado pelos ares. E andou às voltas, todo baralhado, até bater com a cabeça no chão. Mas aí,  já estava do outro lado do vento. E é agora que vocês têm de voltar a adivinhar quem estava deste lado. Sim, sim, agora é fácil. É um texugo muito simpático .
































Tão simpático que até estava à espera do gnu. E, ainda que este quisesse voltar para terra dele, acabaram a almoçar uma apetitosa tagliatelle com espargos que o texugo estava a fazer. É o que acontece quando, às vezes, somos levados pelo vento e aterramos em lugares desconhecidos.


É a partir daqui que o livro também vai pelos ares e que vos convidamos a agarrar nos miúdos e a espreitarem o que acontece. Bem precisamos de ser levados para qualquer lado onde possamos encontrar gente simpática que nos receba com um delicioso almoço. E, não se iludam, esta não é uma história só para os mais pequenos. Como diz o Planeta, estes livros são para os primeiros leitores. Os bebés. Os que já não são bebés, mas há dias em que parecem. Os pequenos quase grandes. Os grandes ainda um bocado pequenos. Os mini com visão macro. Os macro que veem coisas micro. Os maiores, portanto! 
Ou seja, para vocês! Acrescentamos nós.




























Um dos nossos livros preferidos neste estranho 2020! Adoramos estas rajadas que, de vez em quando, sopram por aí! 

quarta-feira, 25 de novembro de 2020

O Que Vamos Construir. E se um livro por dia fôr uma vacina contra a pandemia?

6. O Que Vamos Construir, Planos Para Um Futuro Comum | Oliver Jeffers | Orfeu Negro

O Natal sem a chegada de um novo livro de Oliver Jeffers nunca seria igual. Há cerca de dois anos, falávamos aqui do fantástico  Aqui Estamos Nós, Apontamentos para Viver no Planeta Terra, um livro que o autor dedicava ao filho que acabara de nascer. Em jeito de continuidade, o livro que agora chega é dedicado à filha e constrói-se em torno da relação de ambos. Mas, com Jeffers, as coisas nunca são apenas o que parecem e, logo à chegada, somos confrontados com este pequeno texto: Só somos livres para sonhar e fazer planos (para o futuro) quando não temos de lutar para sobreviver (no presente). Para todos os pais e todas as filhas, nesta esfera, cujas hipóteses são menos promissoras do que as nossas, o nosso objetivo é nivelar o terreno. Com amor, Oliver e Mari 

(Em memória do Óscar e da Valeria, que tentaram sem nunca ter conseguido).

O que vão, então, construir pai e filha? Em primeiro lugar, uma história repleta de amor e de afectos, com que brindam os leitores. E que acaba por se revelar um espécie de passaporte para tantas viagens que pais e filhos sonham fazer. 













Com um texto rimado, a cada dupla página os nossos protagonistas surpreendem-nos com a diversidade de coisas fantásticas que constroem. Ou sonham construir. Uma porta, uma casa, um túnel para qualquer lugar ou  essa fabulosa estrada para a lua! 














Um sítio  onde chegar sem hora marcada, um abrigo onde guardar o que trazem de viagens passadas e o amor já reservado. Pelo meio, também há perigos e inimigos. Fazem parte da vida.  Nada que uma chávena de chá e uma boa dose de desculpas não consigam superar. Mas o que eles mais constroem são os laços e as cumplicidades que, certamente, os vão unir toda a vida.



Jeffers mantém-se fiel ao registo do anterior livro, sendo as semelhanças evidentes. Os elementos intertextuais passeiam-se no livro, exibindo, por vezes, alguma ordem caótica. Mas o que mais nos encanta neste livro é a viagem que convida os leitores de todas as idades a fazer.  Apanhem boleia na estrada para a lua, ou no túnel que vos leva a qualquer lado, ou descansem num sítio confortável... Inspirem-se com um pai e uma filha capazes de construir um super relógio para evitar o tempo morto e assim irem construindo o futuro um do outro.
Façam os vossos planos para um futuro comum. Sonhem juntos. Porque não há vírus que ataque o sonho.

terça-feira, 24 de novembro de 2020

Duas Casas. E se um livro por dia fôr uma vacina contra a pandemia?

 

5. Duas Casas, de  Pedro Saraiva e Anabela Dias | Imaginário do Gigante.

A dureza dos dias que vivemos tem virado do avesso as nossas rotinas e as nossas horas. A muitas famílias tem, mesmo, trazido dificuldades acrescidas. Falamos daquelas que partilham os dias dos filhos alternadamente e que, agora, nem sempre conseguem a sintonia desejada para gerir a vida das crianças entre duas casas. A nossa sugestão de hoje transporta um olhar poético de uma criança que vai colocando questões sobre a distância e as vivências das casas onde habitamos. O livro deu origem a uma peça de teatro com o mesmo nome, com marionetas e sombras, levado à cena pelo Imaginar do Gigante. A separação de um casal é o mote para uma história que nos faz sorrir muitas vezes e pensar muitas mais. Dividida em capítulos, sendo o primeiro o das incomunicações, apresenta uma estrutura bilingue com a página da esquerda contando a história em português e a da direita em inglês. Afinal, as casas também falam mais do que uma língua. De forma inteligente e harmoniosa, as ilustrações distendem-se por ambas as páginas, contando a mesma história, mas sem nunca se repetirem integralmente.


Ele e ela desarrumaram todas as gavetas que estavam juntas. Colocaram tudo à pressa em malas separadas. Depois, foram à procura de uma nova casa para morar. Mas as casas que procuramos, nem sempre nos encontram. E procurar uma casa no mundo é muita distância a percorrer.

E porque no mundo existem muitas casas, a busca nunca será fácil. Há casas que moram de dia e casas que moram de noite. Há as altas, as baixas e as assim-assim. As viradas para nascente e as viradas para poente, as bem arrumadas e as fora do sítio... Casas que moram sozinhas e casas que moram umas com as outras. Casas de graça e casas guardadas nos cofres dos bancos, casas com dono e donos sem casa... São muitos os tipos de casa que o leitor pode encontrar neste capítulo. O das casas constipadas e outras por constipar.








Capítulo novo: o princípio de todos os outros capítulos.  É aqui que o leitor fica a saber que há um lugar onde as casas nascem com música lá dentro. Pelas características enunciadas pela menina que nos conta a história, percebemos que estas são as casas que todos gostaríamos de habitar. O que ela mais gosta nas casas são os dias grandes. Porque nas casas dos dias grandes, todos podemos ser quem quisermos. Um castelo, um monstro, ou mesmo um sapo que beija príncipes a toda a hora. As casas onde os adultos não dizem nada  às crianças, quase nada...

Entre o capítulo dificuldade: contas difíceis e o capítulo prático: a correr, percebemos que há aviões que mudam as rotas. E que isso pode deixar as nuvens  aborrecidas por muito tempo... Sem preconceitos nem concessões, muitas são as questões que a menina vai equacionando.  O texto poético e com uma delicada dose de humor entrelaça-se na perfeição nas ilustrações de Dias. Com o seu jeito de menina sonhadora, a ilustradora consegue aqui um registo que transporta para a infância leitores de todas as idades.  Um livro que se transforma ele próprio numa casa onde todos queremos morar por algum tempo.

Não deixem de entrar em todas estas casas. Visitem-nas, habitem-nas ou deixem que elas vos habitem. Afinal, como diz esta criança, "o mais importante numa casa é o seu coração". E ela tem dois: a casa da mamã e a casa do papá. Viajar com ela entre casas, ouvir-lhe os pensamentos, adivinhar-lhe os desejos e encantarmo-nos com a força com que aceita a vida, é, nos dias que correm, um delicioso e imenso prazer. Bem vos dizemos que um livro por dia...




segunda-feira, 23 de novembro de 2020

Hipopómatos em Festa.


Viajamos através do único meio capaz de nos levar a qualquer lado, o LIVRO.

Foi assim que, há 9 anos, iniciámos este blogue. É assim que hoje continuamos a querer dar-vos boleia. Festejamos com vocês, sorteando 3 livros, gentilmente oferecidos pela editora Kalandraka. 

1. A Aranha Muito Ocupada, de Eric Carle

2. 29 Histórias Disparatadas, de Ursula Wolfel e Neus Bruguer

3. No Ovo, de Emma Lidia Squillari

Para se habilitarem basta que deixem aqui o vosso comentário (sobre o blogue ou sobre qualquer livro de que tenhamos falado este ano). O único requisito é que sejam seguidores.


Este é o resultado do sorteio (Random.Org).
Parabéns aos vencedores!
1. A Aranha Muito Ocupada, de Eric Carle, Antónia Estrela
2.29 Histórias Disparatadas, de Ursula Wolfel e Neus Bruguer - Celeste Silva
3. No Ovo, de Emma Lidia Squillari - Joana Marinho

quinta-feira, 19 de novembro de 2020

Menino, Menina. E se ler um livro por dia fôr uma vacina contra a pandemia?

4. Menino, menina, de Joana Estrela | Planeta Tangerina

A estranheza dos dias que correm não se deve apenas à pandemia. O mundo parece atacado de  alguns "vírus" de índole diferente, assentes no ódio, na mentira, na maldade... Cada vez é mais urgente transmitir às nossas crianças os valores que alicerçam um mundo livre, justo e igualitário. Consolidá-los juntos. Quando um livro nos ajuda a fazê-lo, de forma simples e aberta, só podemos aplaudir. É o que acontece com o livro que escolhemos hoje, da autoria de Joana Estrela e editado pelo Planeta Tangerina, um lugar onde um livro nunca é só um livro. Começando por introduzir a questão da identidade, à medida que lhe vamos virando as páginas ele transforma-se numa celebração da diversidade, da liberdade, do respeito por cada um e por todos. 

As perguntas são lançadas. Algumas, já as ouvimos até à exaustão. Menino ou menina? Azul ou rosa? Calção ou vestido? Mas depois vêm as outras, as que nos fazem pensar. Precisas de saber se é rapariga ou rapaz? E se não é nem uma coisa nem outra?


Menino ou menina, rapariga ou rapaz, homem ou mulher? As perguntas pedem reflexão. Poderá aquilo que somos ser assim tão redutor? Não seremos todos  a soma de muito mais do que isso? A autora acompanha-nos. A espaços, vai deixando a sua opinião. Num registo puro e genuíno, com que os seus leitores rapidamente se identificam.

Um registo que se estende às ilustrações. Estrela já nos habituou ao seu traço de menina onde os mais novos facilmente se revêem e que continua a encantar os leitores mais crescidos. Dono de  uma boa dose de sensibilidade e algum humor, este é um livro para entrar de mãos dadas com a pequenada. Dito de outra forma, é uma lufada de ar fresco  de que bem precisamos. 



 
Menino ou menina? E se não é nem uma coisa nem outra? Uma coisa parece certa. A resposta não está debaixo da roupa.

quarta-feira, 18 de novembro de 2020

Espera, Miyuki. E se ler um livro por dia fôr uma vacina contra a pandemia?

3. Espera, Miyuki de Roxane  Marie Galliez e Seng Soun Ratanavanh | Orfeu Negro

Nunca a palavra paciência nos pesou tanto como nestes dias intermináveis que vivemos. Às vezes, pensamos que se nos pedissem para formular um desejo, pediríamos que fossem inauguradas fábricas de paciência. Uma vez abertas, agarrávamos nas nossas crianças e íamos buscar as doses necessárias. Porque são elas, as crianças, quem mais precisa.
O livro que hoje escolhemos não podia ter chegado em momento mais oportuno, já que esta temática se tornou recorrente com os mais pequenos. 
A pequena Miyuki não vê a hora de ir lá para fora festejar a chegada da primavera. Apressa o avô, não entendendo porque, numa data tão importante, o dia despertou primeiro que ele. O avô não tem essa pressa, sabe que o dia é grande... Mas, Miyuki quer a sua companhia não só para saudar a chegada da nova estação, como também para se despedir do último luar de inverno.  Os dois acabam indo jardim fora, envoltos num espectáculo de cores, dando os bons dias às cerejeiras e a todas as flores com que se cruzam.







Miyuki, atenta a todos os detalhes de um dia tão importante, não pode deixar de reparar numa pequena flor, que tal como o avô, parecia não ter pressa em despertar. Não era possível que não desabrochasse a horas de saudar a primavera. O sábio avô bem lhe explicou que nem todas flores dançam ao mesmo tempo. Que, por ser mais frágil e preciosa, aquela aguardava a água mais pura... Mas a impaciência da pequena não se compadecia com tanta explicação e antes mesmo do avô acabar, já ela andava à procura de água para a pequena flor.








































Miyuki não mediu esforços  na sua busca.  Um poço seco, uma nuvem vaidosa e presumida, uma cascata, um rapaz... Falou com todos, mas as palavras "agora" e "já", que  evidenciavam a sua impaciência  e alguns percalços próprios da pressa, impediram  que alcançasse o que procurava. 
Sem água para a pequena flor, a menina só voltaria a casa no dia seguinte, trazida pelo rio.
Às vezes é melhor ir devagar, dissera-lhe ele. 







































Com um final delicioso, este é um livro onde a poesia atravessa texto e imagens. Celebrando a cultura japonesa, os alegres e elegantes padrões florais pintados em tons vermelhos, verdes e amarelos são um festim para os olhos. Objectos como o quimono ou o fabuloso cisne de origami não deixam dúvidas ao leitor sobre os magníficos lugares que visita. 
Agarrem nas crianças, que facilmente se identificarão com Miyuki, e passeiem-se, pacientemente,  por este lugar encantado onde se cultiva a arte de saber esperar. 
Não nos cansamos de vos dizer que um livro por dia pode bem ser uma vacina contra a pandemia.