quinta-feira, 31 de março de 2022

Viver. Um Novo Olhar Sobre os Animais


 





















Viver | Virginie Aladjidi, Caroline Pellissier e Emmanuelle Tchoukriel | Kalandraka


As curiosidades que nos são contadas sobre as mais de 200 espécies de animais que se passeiam pelo livro, fazem jus à referência que encontramos na nota introdutória de que esta é uma obra que se transforma numa ode à diversidade e singularidade do mundo. Da autoria da consagrada dupla dos Inventários, agora reforçada por Pellissier, este é um livro deslumbrante para miúdos e graúdos.
























Seccionado por 23 capítulos ( sedução, reprodução, nascimento...), o objectivo foi fazer um livro cujas temáticas por capítulos fossem comuns ao homem e ao animal, seguindo o desenrolar de uma vida, do nascimento à morte, e pondo em relevo as incríveis particularidades de alguns animais. 
























Capítulo a capítulo, os leitores vão-se deleitando com os detalhes e as informações sobre cada espécie e temática escolhidas. Saber como seduzem alguns animais, como comunicam, as emoções que sentem, como reagem à morte... são apenas alguns exemplos do muito que pode ser partilhado entre leitores de todas as idades. 























Tchoukriel já nos habituou às suas delicadas e precisas ilustrações científicas sobre a natureza.  Aqui, volta a encantar-nos com mais de 200 ilustrações a tinta e a aguarela, oferecendo-nos um livro que tem tudo para ser desfrutado em família e que apaixonará tanto crianças como adultos. Já agora, sabiam que o "hipopómato" tem o dente duro de roer?

segunda-feira, 21 de março de 2022

Sê Uma Árvore


 






















Sê Uma Árvore | Maria Gianferrari e Felicita Sala | Fábula

Estica-te bem alto. Estende os teus ramos para o Sol. E que melhor sugestão para celebrar o Dia da Árvore do que sermos uma?















O texto de Gianferrari é um hino às árvores e à natureza, à solidariedade e à partilha, revelando-se um convite para tornar o mundo num lugar melhor e mais justo. Inspirando-se no livro de Peter Wohlleben,  The Hidden Life of Trees, um precioso e magnífico testemunho sobre o "sistema social" das árvores, a forma como se protegem e partilham entre si os recursos que cada uma possui, a autora incita-nos a seguir o exemplo. De metáfora em metáfora, as aguarelas de Sala vão evidenciando os pontos comuns entre a morfologia das árvores e a nossa.


As árvores são múltiplas e de diversos tamanhos. Enraizam-se nas duplas páginas do livro que brinda os leitores com um desdobrável, onde famílias de diferentes raças e culturas convivem num cenário marcado pela imponência das árvores. É óbvia a relação entre a biodiversidade e a diversidade humana.


Sem olhar a diferenças, as árvores-mãe cuidam das árvores juvenis, as árvores mais velhas dão sombra às mais novas, as mais fortes protegem as mais fracas... 
Uma família que nos faz acreditar que juntos podemos formar uma floresta.



No final do livro, para além da nota da autora, os leitores encontram alguns conselhos para ajudar a salvar árvores e ficam a saber um pouco mais sobre a sua anatomia. Um livro precioso que nos ajuda a lembrar que, como diz Wohlleben, quando salvamos a natureza nos salvamos a nós próprios.

quinta-feira, 17 de março de 2022

Molha -Tolos























Molha - Tolos | Fernando Pérez Hernando | Kalandraka


- Pudu fucur cuntugu utu purur du chuvur? A pergunta é de Lulu, que só arrulha com o "U"

- Cloro. A resposta é dada por Jojó, que só gorjeia com o "O". 

Há ainda a Lili, que só trina com "I" e o Zezé, que só aprendeu o "E." Os quatro irmãos vivem tranquilamente numa árvore, com a mamã pássaro, que só canta até ao "A". Parecem todos muito independentes e senhores do seu nariz, vivendo cada um em seu ramo. 





Num dia de mau tempo, a chuva acaba por lhes mostrar que todos precisam de todos e que juntos enfrentam melhor as contrariedades da vida. À medida que a água lhes vai caindo em cima, há uma espécie de dança de ramo em ramo. Todos se vão mudando e juntando em busca de uma solução colectiva. O reconhecimento de que a solidariedade e a união são valores essenciais.







































Esta é uma família que os mais pequeninos vão querer conhecer. Apresentados um a um, a escolha dos cinco elementos que a compõem não foi ao acaso. A cada um, o autor faz corresponder uma das vogais, resultando numa deliciosa brincadeira rimada e num jogo fonético que todos vão querer decifrar e repetir vezes sem conta. Depois de A Escada Vermelha, de que falámos aqui, Hernando volta a brindar-nos com esta história circular, onde a simplicidade e o humor andam de mãos dadas. Num cenário minimalista, são os diferentes planos da árvore casa que colocam em evidência os diversos momentos da narrativa.


Os petizes acabam por se socorrer das asas da mãe, que, de forma sábia, acaba encontrando a solução. Mas, um final redondo deixa antever algumas sonoras gargalhadas. Com ou sem guarda chuva, abram o livro às crianças e deixem que se encantem com esta divertida família. 

Mulhu-tulus?


sexta-feira, 11 de março de 2022

O Rapaz e o Gorila


 

O Rapaz e o Gorila | Jackie Azúa Kramer e Cindy Berby | Orfeu Negro


Esta é uma história sobre a morte, o turbilhão de emoções e o sofrimento que ela pode causar numa criança que acaba de perder a mãe. Aparece, entre nós, no momento em que as histórias reais do sofrimento de um povo que nos é próximo nos atormentam. Todos os dias choramos com e pelas crianças que vemos no terrífico cenário de guerra.  Repetimos até à exaustão que tudo isto era inimaginável. Mas, o que não se podia imaginar tornou-se realidade. O livro foi feito e publicado antes da guerra mas, quando o habitamos, torna-se impossível não pensar em todas as crianças que vão perder entes queridos e no sofrimento que isso lhes causará. Inimaginável, sim. 


Um cenário sombrio e de profunda tristeza aguarda o leitor, tornando-o parte dos momentos finais de despedida e de homenagem à mãe do menino. Tanto no cemitério como em casa, a dor é visível. Nas posturas e nos silêncios. É um inicio sem palavras porque estes são momentos em que elas nada acrescentam. Visível é também a presença do gorila. A sua cor e tamanho parecem simbolizar a dimensão da tristeza do rapazinho. Primeiro, vemo-lo a uma distância considerável, mas, na página seguinte, ele já enche a casa. Como se pertencesse ali. Uma espécie de vigilante. 




Percebemos a necessidade do menino em sair de casa. De procurar refúgio no jardim, um dos lugares da sua mãe. De ficar sozinho. É aqui que o diálogo se inicia. 

- O jardim da tua mãe é muito bonito. Posso ajudar?

A sensibilidade e o carinho do suposto amigo imaginário não parecem ter tamanho. A conversa vai tecendo a proximidade com o menino. Na mesma proporção que o leitor vai conhecendo os estados de alma e as legítimas questões que lhe invadem a cabeça. 



A figura do pai está sempre por perto, mas a ausência e o alheamento são notórios. É com o gorila que o menino fala. É com ele que vai fazendo o luto. Falar sobre as coisas ajuda-nos a encará-las. As perguntas são de peso. Como é que sabemos que uma pessoa morreu? Para onde é que foi a mamã? A minha mãe não pode voltar para casa? Porque é que ela teve de morrer?
O gorila parece ter o tempo todo do mundo. De forma sábia e serena, vai encontrando as respostas.  Com a honestidade de que carecem as situações imutáveis.  A morte não tem volta.


Quando é que vou sentir-me melhor? / Quando perceberes que ela ainda está contigo. / Como quando fazemos as bolachas da Mamã? / Sim, cada trinca é uma memória.

Lentamente, a criança parece ir descobrindo como lidar com os sentimentos até agora desconhecidos. A ajuda do gorila verte-se em pequenos gestos que lhe recordam o amor da mãe. Ao mesmo tempo que prepara a aproximação da criança ao pai e a sua saída de cena. É nesse conforto que o menino encontra alento para confessar ao pai que sente a falta da mamã.  E trazê-lo de volta. É nesse amor que ambos encontram a força para o recomeço.



O avassalador turbilhão de sentimentos do menino é transmitido ao leitor tanto pelo curto e sábio texto como pelas aguarelas de Derby, a ilustradora de O Mundo Cá Dentro. As cores escolhidas, as pinceladas, os jogos de sombras são magnificamente cuidados e pensados. Este é um livro onde o tempo tem tempo. Onde até o leitor sabe esperar. É assim o luto. Sofrido e demorado. Algo que nenhuma criança deveria viver, mas que para muitas é real.


sexta-feira, 4 de março de 2022

O Casamento do Meu Tio

 






















O Casamento do Meu Tio | Sarah S. Brannen e Lucia Soto | Booksmile

Tendo conhecido uma primeira versão em 2008, com Brannen a assinar texto e ilustração e com personagens antropomórficas, o livro aparece agora reformulado. As ilustrações de Soto e as novas personagens elevam-no a outro patamar, revelando-se uma subtil e delicada ode ao amor e à diversidade. 







Com a natureza como fundo e toda a família reunida num piquenique, a pequena Camila não cabe em si de contente quando vê chegar o tio Miguel acompanhado do namorado, João. É o seu tio preferido, aquele que a leva a passear de barco no rio, lhe ensina o nome das estrelas e das constelações... Camila adora o tio e, de tudo, o que mais gosta de fazer com ele é lançar papagaios de papel.





















Aproveitando a reunião de família, o Tio Miguel e o João anunciam a grande novidade: vão casar-se! A emoção e a felicidade que o anúncio provoca são visíveis em todos os membros da família. Todos, menos Camila! E nem as explicações da mãe sobre o casamento ser comum entre adultos que se amam, parecem tranquilizá-la. Os receios são óbvios. Camila tem medo de que o seu tio passe a ter menos tempo para ela. Que os passeios de barco no rio passem a ser apenas uma miragem, que olhar as estrelas no céu passe a ser um momento solitário e, acima de tudo, que os papagaios de papel deixem de voar. Em suma, Camila tem medo de partilhar o seu tio, deixando de ter a atenção e o tempo que ele habitualmente lhe dispensa.
























Mas, como todos os tios preferidos, Miguel é mesmo um tio especial. Percebendo a reacção da sobrinha, trata de lhe demonstrar que todos os seus receios são infundados. Ela será sempre a sua princesa. E, quando dias depois, o Miguel e o João a convidam para ir com eles ao ballet, todas as dúvidas da pequena se dissipam. 


A diversão é grande com o João a imitar as bailarinas. Os momentos partilhados a três, como o mergulho no rio e as canções à volta da fogueira, enquanto assam marshmallows, até provocam em Camila o desejo de que João também fosse seu tio. E não foi preciso muito para o ver concretizado.


O dia da festa acaba por chegar. Uma festa onde se celebra o amor, independentemente de género ou raça. Camila é a menina das flores e uma grande ajudante em todos os preparativos. Não podia estar mais feliz. Este é o dia em que ganha mais um tio, naquele que foi para ela o casamento mais bonito de sempre.