A Feira Internacional do Livro Infantil de Bolonha volta a abrir portas. Tal como em Frankfurt, o Brasil é, este ano, o país convidado. Com o prestigio que meio século de existência lhe granjeou, Bolonha é o palco mais apetecível para a mostra de trabalhos de ilustradores de todo o mundo. Este ano, concorreram 3188 ilustradores, oriundos de 191 países. Foram seleccionados 75.
Entre eles, está Catarina Sobral , a única ilustradora portuguesa escolhida, graças às ilustrações do livro recentemente editado pela Orfeu Negro, O MEU AVÔ.
Este é o terceiro livro de Catarina Sobral, depois de Achimpa e Greve, o livro com que se estreou. Traduzida em várias línguas e com alguns prémios arrecadados, a jovem ilustradora e designer de comunicação ocupa já um lugar de destaque no panorama da literatura infantil. O que distingue o seu trabalho e o torna tão interessante?
Os seus livros têm algo de subversivo. São subtilmente desafiantes e provocadores. Mas, acima de tudo, têm uma consistência própria resultante, por um lado, da visão crítica da autora e, por outro, da diversidade de referências culturais e elementos intertextuais que sabe utilizar com grande mestria.
Embora num registo diferente dos anteriores, O Meu Avô não foge a essa dinâmica. Desde logo a figura do avô, a relembrar esse inesquecível Monsieur Hulot, a que não falta sequer o cachimbo. Almada e Pessoa voltam a ser revisitados (depois de Greve), porque este avô tem tanto tempo que até escreve ridículas cartas de amor... durante horas a fio.
As referências culturais não se ficam por aqui. Numa clara e deliciosa invocação (gostamos de ver ali o rapaz...) do mais célebre quadro de Manet, Le déjeuner sur l'herbe, este avô faz também vários piqueniques durante a semana. Comme il faut.
Nem sempre as referências são perceptíveis por todos os leitores, muito menos pelos mais pequenos. Mas como refere um dos nossos autores preferidos, Anthony Browne, ele próprio "useiro e vezeiro" na invocação de pintores célebres, não há a pretensão de que as crianças ou os pais os identifiquem, mas sim que se familiarizem com a arte.
E, no caso de O Meu Avô, se há algo bem perceptível é a história contada pela voz de um pequeno protagonista, o neto, que nos narra o dia a dia do avô, tendo como contraponto o de um vizinho, o Dr. Sebastião. Um contraponto que se faz a cada dupla página e a dois tons, vermelho e verde. É através do uso que cada um faz do tempo que ficamos a conhecê-los. Sem nunca duvidar que este é o avô que todos gostaríamos de ter.
Um avô que costumava ter uma loja de relógios, mas agora tem bastante tempo, enquanto o Dr. Sebastião que não é relojeiro (apesar de estar sempre a ver as horas), nunca tem tempo a perder. Este nunca se esquece de comprar o jornal, já o avô nunca se lembra de ler as notícias.
Embora pouco ou nada tenham em comum, o avô diz que já foi muito parecido com o Dr. Sebastião... Mas isso foi certamente noutro tempo. Porque entre a "stressante" rotina do Dr. Sebastião, revelada sobretudo pelas imagens, e o dia deste "sábio" avô não parece haver qualquer semelhança. Aqui ficam alguns exemplos do uso que o avô dá ao seu tempo: tem aulas de alemão e de pilates, cuida do jardim, bebe chá com uma amiga, faz piqueniques, cozinha, discute pintura, lê peças de teatro e claro, vai buscar o neto à escola.
Estas são apenas algumas das razões porque nós, Hipopómatos, nunca fazemos greve aos livros da Catarina Sobral. E até já achimpamos pelo próximo.
3 comentários:
Lindo! Este eu já tenho. :D
eu ainda não tenho mas está no topo da wishlist! =)
tenho e não me canso de o contar. Achimpo também pelo próximo :)
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