Uma Pedra Cai do Céu | Jon Klassen | Orfeu Negro
Num cenário minimalista, onde todos os silêncios se fazem ouvir, três personagens parecem oferecer-se como objeto de estudo para um qualquer tratado de relações sociais. Dividida em cinco capítulos, a história reveste-se de um humor desconcertante, capaz de nos fazer pensar em Klassen como um discípulo nato de Edward Gorey.
Este foi o livro que se seguiu à trilogia dos chapéus, o que é facilmente detectado pelo leitor. As personagens são-nos familiares. Cruzámo-nos com elas em Onde está o Meu Chapéu?, o último livro de que falámos. De forma semelhante, as falas das personagens distinguem-se pela cor diferenciada. A paleta de cores confirma que entrámos no universo do autor. Os chapéus (Este Chapéu não é Meu), com mais ou menos variação, permanecem na história, mas sem o protagonismo que já conheceram. Aqui, o importante é a pedra.
Quando abre o livro, o leitor já sabe que uma pedra vai cair do céu. O título deixou-o alerta. Não sabe quando nem como. Não conhece as consequências. Mas, a espaços, vê a pedra e a queda é iminente. O suspense e a expectativa habitam-no quando entra naquele cenário desértico . De um lado, apenas uma pequena flor. Do outro, uma pequena planta. Aguardam-no uma tartaruga e um tatu, ambos com chapéus de coco, numa clara e assumida evocação de Samuel Beckett e do seu À Espera de Godot.
Uma tartaruga orgulhosa e obstinada faz a apologia do seu sítio preferido. Precisamente, aquele onde se encontra. O melhor de todos! O tatu não sente o mesmo por aquele lugar, tendo mesmo um mau pressentimento. Decide-se pela página do lado. Simpático, lança o convite à sua interlocutora. Mas, ela é demasiado teimosa e inflexível para isso. Curiosamente, é o ciúme que a salva. É quando a serpente, a terceira personagem, se junta ao tatu, que a tartaruga enciumada, se decide a atravessar a página. Concluída a travessia, os três observam a queda da pedra, ou melhor, da rocha, bem em cima do lugar preferido da tartaruga. Ao leitor, o estrondo parece audível.
Uma hilariante estranheza atravessa todos os capítulos. Ao perigo da queda da pedra, junta-se o do aparecimento de um alien num futuro imaginado pelo tatu no único capítulo que foge ao vazio do cenário. O vai-vem entre páginas é uma constante. O espaço ou a falta dele assume uma importância crescente. Os diálogos são um desfiar de conversa fiada que transmitem ao leitor a forma de ser de cada uma daquelas criaturas. De um lado, um tatu paciente, conhecedor e prestável. No outro, uma tartaruga com um ego gigante, mentirosa q.b., que nunca tem dúvidas, que nunca precisa de ajuda, que nunca está cansada... Pelo meio, há ainda uma serpente low profile, que parece decidir-se sempre pelo lado certo.
Tudo, debaixo de um incrível céu, onde um deslumbrante pôr do sol nos faz querer permanecer. Vão, mas não deixem de reflectir sobre o lado que escolhem. É que do céu não cai só uma pedra.
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