terça-feira, 22 de outubro de 2013

Assim, Mas Sem Ser Assim.

Considerações de um misantropo.


Parecem fazer parte de nós. Insistem em ser companhia de todos os dias. Afinal, é disso mesmo que parecem falar, dos nossos dias. E de pessoas. Daquelas com quem nos cruzamos todos os dias ou dia nenhum. Em comum,  uma identidade. Foram escritos e ilustrados por Afonso Cruz.


À semelhança do que acontece em Contradição Humana, Assim, Mas Sem Ser Assim, considerações de um misantropo, é um livro construído a partir da observação do quotidiano e de quem o povoa. Mais uma vez, é o olhar inocente e questionador de uma criança que põe a nu idiossincrasias e contradições, que tantas vezes escapam aos adultos, tornando-os seres acríticos e socialmente pouco conscientes. 


Seguindo o conselho do pai, que costuma dar bons conselhos e usa barba, o nosso jovem narrador decide contrariar a propensão para passar muito tempo em casa e comunicar pouco. Uma mão cheia de ironia e o humor crítico a que o autor já nos habituou, condimentam a viagem que faz por quem  está mais à mão para comunicar, os vizinhos.



Andar a andar (o prédio tem 8) somos apresentados a cada um dos vizinhos, ficando a conhecer-lhes os traços peculiares... 
No 3C mora uma pessoa muito magra, que lhe comunicou ser "tão extremamente elegante" por ser modelo. 
No 6C mora uma pessoa um pouco gorda ou a atirar para o forte que quase não come, pois quer emagrecer. Comunicou-lhe que por vezes tem momentos de fraqueza. 
No 7A mora um poeta, que passa a vida sozinho e não abre a porta a ninguém.  O que leva o rapaz a desconfiar de puder tratar-se de um misantorto ou até de um misantodo
No 3A, mora um bailarino que anda sempre descalço e que tem como cobertor preferido as estrelas.


Depois, ao virar da página, ali está esse final! Inesperado? Surpreendente? Desconcertante? Sim, tudo isso! Quando lemos o livro com Hipopómatos mais pequenos, o comentário surgiu: " Gostava tanto de poder telefonar ao Afonso Cruz para lhe perguntar como  é que ele se lembrou deste final!"

  
A intertextualidade e o uso de  metáforas são indissociáveis da sua escrita. "O meu pai, que tem barbas, disse-me: As palavras mais fortes são poemas. A palavra não, quando cresce, torna-se talvez, e as palavras que levantam mais peso são as mais delicadas(...). Sim, mas as palavras também crescem, como as árvores, e vão mudando de significado ao longo da vida, começam por querer dizer uma coisa e acabam por dizer outra. Ninguém quer manter-se igual para sempre e até as lagartas começam a voar, um dia."

Talvez sejam elas que nos fazem acabar um livro de Afonso Cruz e ficar avidamente à espera do próximo! Que, simplesmente, nos fazem gostar de sétimos andares! E que já nos fazem andar aqui  às voltas para saber Para Onde Vão Os Guardas-Chuvas!

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