Lembras-te? | Sydney Smith | Fábula
O presente entrelaça-se, de forma bela e poética, com as preciosas memórias de um passado não muito longínquo. Um tempo que se revela feliz é agora lembrado por mãe e filho que parecem alicerçar nele a força para viver o presente e construir o futuro.
Num cenário envolto em tons escuros, vários planos dos rostos, das mãos e dos pés mostram os dois protagonistas deitados, num aconchego feito de proximidade, recordando nostalgicamente o que ficou para trás. É através da evocação dessas memórias que o leitor fica a conhecer melhor a vida que já tiveram. O lugar onde viviam, o tempo passado em família com o pai e o avô, pequenos grandes momentos reveladores do afecto e do amor que preenchiam os seus dias. Uma história de vida contada a partir da dicotomia passado e presente.
A pergunta que dá título ao livro está presente a cada dupla página, situando o leitor no momento presente e partilhando com ele as recordações de mãe e filho. As falas de ambos são assinaladas por cores diferentes, permitindo-nos identificar quem lembra o quê.
Os tons escuros que pintam os silêncios e a nostalgia das memórias, contrastam com as cores usadas nas vinhetas que ilustram, sequencialmente, alguns momentos do passado: dias de piquenique, de aniversário, a primeira bicicleta e a primeira queda, a casa do avô...
Depois do incrível Ser Pequeno na Cidade, o seu livro estreia a solo, o autor volta a deslumbrar-nos com um livro onde o peso da partida e da separação se debate com a esperança de novos recomeços. Afinal, uma temática que é, hoje, coisa de todos os dias. O estilo de Smith, já aqui o dissemos, é indissociável do seu gosto pelas vinhetas, pelos quadros em que distende sequencialmente as suas histórias, pelas manchas de toque impressionista, mas sempre fornecendo ao leitor retratos fiéis da realidade. Este livro, dedicado à sua mãe, não é excepção.
Não sabemos as razões que motivaram a partida, que deixaram o pai e o avô para trás, mas intuímos a força que os dois precisam para enfrentar tamanha mudança. No final, o rapaz mostra-se confiante, dando ao leitor uma informação adicional: aqui não têm que estar preocupados ou assustados. Como que por magia, o sol nasce sobre a casa nova e o cheiro da padaria do outro lado da rua mistura-se com a certeza de que no novo caminho tudo vai correr bem. Os momentos de agora transformar-se-ão, também eles, em preciosas e alegres memórias.
Uma já existe. A viagem que os trouxe até aqui. À cidade onde se perderam, acabando guiados pelo ursinho de peluche que o pai lhe tinha dado. Lembras-te?