O Duelo | Inês Viegas Oliveira | Planeta Tangerina
Podia ser a crónica de um duelo anunciado. Entramos preparados para um expectável cenário de luta, de conflito, de armas. A memória enche-se de um sem número de imagens cinéfilas onde os duelos eram coisa comum. Mas, às primeiras páginas, o leitor já está seduzido pela mudança do rumo da história. O anunciado não se concretiza. 1, 2, 3, 4... Um dos homens não se vira, decide seguir em frente. Cobardia?
Ele diz que não e nós acreditamos porque o vemos trocar um exército por uma banda de magníficos músicos. Apenas decidiu seguir em frente. Cabe ao leitor persegui-lo, embarcarcando numa viagem por um mundo onde não parece haver lugar para guerras. Uma viagem que se revela uma descoberta contínua de elementos e detalhes que nos oferecem uma deslumbrante narrativa visual. Afinal, este é um livro sobre paz.
Podemos não saber a localização certa, mas, tal como o nosso homem, sabemos que não estamos perdidos. Atravessamos o mundo. Por terra e por mar. Percorremos montes, vales e serras. Deambulamos pelo campo e por cidades. Vemos palácios, casas, cafés, teatros, pessoas, animais, artistas e malabaristas... Embrenhamo-nos nas páginas. Demoramo-nos. Queremos habitar todos aqueles lugares e tempos.
Sabemos que o homem que seguimos escolheu a paz. Gostamos das cores do mundo por onde caminha e do que vemos. Dos lugares aquecidos pelo sol, das muitas flores que pintam os recantos onde agora pertence. Não lhe conhecemos a identidade. Em contrapartida, sabemos que aquele com quem tinha duelo marcado dá pelo nome de Rodin Rostov. É a ele que se dirige ao longo de toda a sua caminhada. Um relato que partilha com os leitores e que chegará ao outro em forma de carta.
Excelentíssimo Senhor Doutor Rodin Rostov, assim começa a história. No final, ficamos a saber que mora no nº17 de um lugar muito longe e muito frio. A carta encerra um convite. Para que saia de lá. Para que também ele tenha a coragem de seguir em frente. Porque é disso que se trata. Deixar para trás as coisas pequenas e mesquinhas da vida, as quezílias, as zangas que não levam a lado nenhum. Seguir em frente, em busca de um mundo melhor, será sempre um acto de coragem.
Autora de texto e ilustração, Oliveira demonstra aqui o domínio de ambas as linguagens, a escrita e a visual. Detentora de uma magnífica técnica e de um estilo encantador, o seu trabalho parece envolto em influências expressionistas e reporta-nos, a espaços, para a obra do espanhol Javier Zabala.
O traço fino com que dá vida às silhuetas, a multiplicidade dos elementos e a vibrante paleta de cores são contributos para um livro que respira sensibilidade e poesia.
Um livro que, certamente, encantará leitores de todas as idades. Um lugar a que se voltará muitas vezes. E onde, a cada regresso, faremos novas descobertas.
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