Hipopómatos e Hipopótamos são a mesma coisa? A pergunta foi feita há uns dias por um dos nossos pequenos leitores. A mesma coisa não, mas são da mesma família, respondemos. Irmãos, primos, um pouco de tudo. Conhecida a nossa paixão pelos bichos, ninguém se surpreenderá se confessarmos que exultámos quando nos chegou às mãos o último livro de Catarina Sobral, Tão Tão Grande, editado pela Orfeu Negro.
A razão mais óbvia é que o protagonista, de nome Samuel, é um hipopótamo! A irmã, o pai, a mãe, claro está, são hipopótamos! Mas há outras razões para esta família de peso não ter saído mais da nossa Casa.
A história revela-se uma deliciosa e divertida abordagem sobre a temática do crescimento. Certa manhã, ao acordar, o Samuel deu por si na cama transformado num gigantesco hipopótamo. As patas já não cabiam nas pantufas, nas sapatilhas, nas galochas ou nos chinelos de praia, o focinho já quase não cabia no espelho e Samuel, até pôde constatar, estupefacto, o aparecimento de... um bigode!
Samuel estava nervoso, não sabia o que fazer e muito menos o que dizer... Do lado de lá da porta, uma voz suave insistia para que saísse, estava na hora de ir para a escola. Mas as respostas faziam-se ouvir numa voz tonitruante proveniente de um "corpinho" de 528 kg.
As semelhanças com a obra de Kafka, A Metamorfose, são óbvias e assumidas com uma boa dose de humor. Bastará ao leitor passar os olhos pelos compêndios de entomologia de que Samuel tanto gosta, para se cruzar com Gregor Samsa, a famosa personagem kafkiana. Dela falámos aqui, a propósito de Ícaro.
Entre alegadas dores de barriga e uma valente fome de leão, o nervosismo de Samuel parece aumentar na mesma proporção do espaço que vai roubando aos objectos, remetidos ao mundo da pequenez, que coabitam com ele no quarto.
De forma brilhante, os desenhos de Catarina Sobral espelham não só essa relação de grandeza entre o tamanho do corpo do hipopótamo e o diminuto espaço a que se vê confinado, como igualmente o crescente nervosismo e a luta interior que Samuel vive do lado de cá da porta. Como sair dali, eis a questão para a qual nem o princípio de Arquimedes parece ser solução.
Com a paleta de cores a que já nos habituou, onde predominam o azul e o vermelho, e um notável jogo de sombras, Catarina Sobral consegue, mais uma vez, surpreender-nos com uma história inteligente, divertida e cheia de subtilezas.
O crescimento e as transformações que dele decorrem são, muitas vezes, assustadoras e nem sempre se lida bem com elas. Mas são tão inevitáveis quanto naturais. Essa é a grande diferença entre Samuel e Gregor Samsa, que acaba justificando o final da história.
A vocês, caros leitores, resta abrir o livro para saberem o que aconteceu a este tão tão grande hipopómato. Ups! Hipopótamo, queremos dizer.
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