terça-feira, 15 de outubro de 2024

Um e Sete

 





Um e Sete | Gianni Rodari e Beatrice Alemagna | Kalandraka


Quando Gianni Rodari escreveu este conto, que integra os Contos ao Telefone, talvez não suspeitasse que volvidos mais de 60 anos, ele fosse tão adequado aos tempos negros que vivemos e passível de tocar tão intensamente leitores de todas as idades. Magistralmente ilustrado por Beatrice Alemagna, esta ode à paz e à diversidade transforma-se num relato de esperança e amor que percorre a infância até à idade adulta. 



É a história de um rapaz que era sete meninos num só. Viviam em lugares distintos (grandes cidades capitais do mundo), falavam línguas diversas, mas quando riam, faziam-no na mesma língua. Sete meninos diferentes, afinal um só. Os pais têm profissões distintas, mas os meninos têm hábitos iguais. Todos sabem ler e  escrever, andar de bicicleta sem mãos, brincar, ser criança... 
Todos diferentes, todos iguais.



























Uma história tocante, de uma extrema sensibilidade que percorre  texto e ilustração. Mais do que actual, necessária. Este é um daqueles livros que sempre nos acompanha. Pena que os homens que, entretanto foram crescendo em tamanho, não tenham crescido em cabeça e coração e não o queiram, também eles, por companhia. 
















Era uma vez um rapaz que era sete meninos num só. Muito mais o que os une do que aquilo que os separa, quando crescem, no seu mundo, não há lugar para a guerra. Afinal são um só. Gostamos deste mundo e, tal como escrevemos aqui em 2017, há muito que fizemos a nossa reserva. 

quinta-feira, 10 de outubro de 2024

Gato Comum




Gato Comum | Joana Estrela | Planeta Tangerina


Tudo por aqui aparenta ser comum. O gato, a família, a casa, as rotinas. O que nada tem de comum é a mestria com que Joana Estrela, alicerçada na simplicidade das coisas de todos os dias,  constrói uma história intensa e tocante, levando o leitor a apropriar-se desta ou daquela vivência. Quem tem animais domésticos conhece a inevitabilidade da dor quando chega o momento de nos deixarem. Nesta história, a longevidade do gato faz adivinhar a proximidade do fim.



 



Manel, o gato da casa, tem a mesma idade de Cristina, a adolescente de 17 anos, filha única da família. É ela que abre as portas da casa para contar o que o leitor cedo percebe serem os últimos dias de vida do gato. O relato da rapariga é feito de memórias, de cumplicidades, de hábitos e rotinas, do muito que o Manel deu e recebeu, das suas manias, dos seus dias. Enquanto a morte não chega há por aqui a celebração de toda uma vida.







































A história do Manel é também a história das pessoas com quem partilha a vida, Cristina e os pais. O leitor conhece um pouco de cada um. Do que os une, do que os separa. O livro chegará ao fim e os dias do Manel também. A terrível frase que nunca queremos ouvir está mesmo atrás da porta: O Manel já não tem qualidade de vida. 
São dias amargos e tristes. A decisão tem de ser tomada, mas não é consensual nem constante. Porque muito dela se toma com o coração.







































"É sábado de manhã. O gato ainda está vivo. Mas também ainda está a morrer." 

Há muito para reflectir enquanto nos demoramos nesta casa. Dor, luto, morte, eutanásia. Retalhos de uma vida que se celebra, retratos da adolescência, o amor incondicional pelos animais que adotamos, as indecisões e a coragem sempre necessárias nos momentos difíceis, o fortalecimento da família... Há por aqui muitas histórias dentro da história.
O livro integra a coleção Dois Passos e Um Salto, onde a autora já assinou "Aqui é um Bom Lugar"(a meias com Ana Pessoa) e "Pardalita". Num tempo em que continuamos a ouvir recorrentemente que as nossas crianças se perdem para a leitura à medida que vão "adolescendo", estes são preciosos incentivos a que, seguramente, não ficarão indiferentes.







































Neste regresso de Estrela à BD, um reino  que parece seu por direito próprio, aplausos para este excepcional gato comum.