Depois de Gaston e Outro, a editora Orfeu Negro traz para Portugal mais um livro do californiano Christian Robinson. És Importante chega na altura certa. No meio de uma pandemia que virou do avesso hábitos e rotinas, não podia ser mais oportuno valorizar o papel de cada um no mundo e mostrar às crianças que todos contam. Independentemente de quem somos, onde estamos ou do que temos. Elas, seguramente, agradecem esta singular e maravilhosa forma de elevação da auto estima. Todos são importantes. Todos fazem a diferença.
A dedicatória do autor é elucidativa: Para quem não tem a certeza se faz a diferença.
Robinson demonstra uma singular e inteligente subtileza nas formas que encontra de contar o mundo. Neste caso, a história começa mesmo antes de abrirmos o livro. A genial diversidade de crianças que vemos na capa e a óbvia importância da tarefa que cada uma desempenha no grupo aliadas ao título são, para o leitor, premissas de uma brilhante história guardada nas páginas de dentro. As guardas abrem caminho e acolhem o leitor numa grande cidade, onde podemos localizar as crianças a brincar. Ao invés do que seria expectável, a primeira página é minimalista. Nela, uma criança negra, que nos lembra Outro, observa através de um microscópio. Uma coisa tão mínima que mal se vê.
As poéticas frases curtas que compõem o texto dão ao leitor a medida exacta do que é essencial. Repetindo-as em cenários diferentes, o autor oferece-nos uma história circular de grande brilhantismo. O último a ir e o primeiro a chegar. És importante.
A cada virar de página, o leitor vai percebendo que tudo é uma questão de perspectiva. Melhor, de perspectivas. Da forma como olhamos o mundo e nos ligamos a ele. Grande ou pequeno, o último ou o primeiro, a favor ou contra a maré, velho ou novo, longe ou perto... Todos contamos. Todos somos importantes.
A diversidade está espelhada em todas as páginas e, dificilmente, existirá uma criança que não se identifique com o grupo.
O microscópio inicial cede lugar a um cenário cósmico, onde todos continuam a ser importantes. As imagens vão dando conta de como todos estamos ligados. E essa é a maior das subtilezas, quase como se o leitor não detetasse a continuidade existente na narrativa. A astronauta, uma mulher negra, exibe a fotografia de um rapaz negro, que por sua vez aparece nas páginas seguintes... São várias as conexões que a linguagem imagética permite ao leitor descobrir enquanto percorre o livro. E vale a pena percorrê-lo muitas vezes.
O livro de Robinson teve ainda um outro sentido de oportunidade no seu lugar de origem, uma vez que coincidiu com o auge dos protestos sociais originados pela morte de George Floyd. Em entrevista ao Milwaukee Journal Sentinel, aquando da apresentação virtual do livro, o autor sublinhou: "realmente acredito que a maioria dos problemas do mundo hoje tem a ver com as pessoas não sentirem que são realmente importantes ou valiosas. E eu acho, é claro, que tudo começa na infância. Sim, eu acho que o mundo pode ser um lugar diferente se recebermos essa mensagem logo no início e realmente acreditarmos nela."
Nós também! E ainda achamos que Christian Robinson se tornou um autor importante no panorama da literatura infantil. Ainda que à distância, estamos ligados. E vocês?