sexta-feira, 27 de novembro de 2020

quinta-feira, 26 de novembro de 2020

O Gnu e o Texugo. E se um livro por dia fôr uma vacina contra a pandemia?


 7. O Gnu e o Texugo, Cuidado com o Vento | Ana Pessoa e Madalena Matoso | Planeta Tangerina

Que história é esta? Um gnu e um texugo? Empurrados pelo vento? O quê? Este livro também? Andou às voltas e ficou todo baralhado? Mas que história tão fantástica!
Somos fãs da coleção mini-micro  do Planeta Tangerina. E andamos tão encantados com esta história que não há ventania que nos faça perder de vista o gnu e o texugo. De pequeno formato, com um título divertido e intrigante e uma capa deliciosamente apelativa, gostamos dele mesmo antes de o abrir. Mas quando o fazemos, ficamos por lá um tempo sem fim. O texto de Pessoa é uma deliciosa  brincadeira e as ilustrações de Matoso são desconcertantemente bonitas. Pequenos quadros que podemos ver com as crianças como se deambulássemos por uma exposição.
Um hino à criatividade, esta história acaba no meio do livro. A culpa é do vento. Mas depois recomeça. Toda baralhada.  A culpa também é do vento. Mas que grande trapalhada! Agora, o texto está trocado, as ilustrações também, as páginas... O pinheirinho todo torto bem avisou, mas ninguém lhe deu ouvidos.




























O início da história não podia ser melhor.  Adivinha lá quem andava ali a passear
Mas entre miúdos e graúdos, alguém se atreve a não adivinhar que era  um gnu muito elegante com o seu chapéu azul? O mesmo gnu que não ouviu o aviso e, como era um grande cabeça de vento, foi levado pelos ares. E andou às voltas, todo baralhado, até bater com a cabeça no chão. Mas aí,  já estava do outro lado do vento. E é agora que vocês têm de voltar a adivinhar quem estava deste lado. Sim, sim, agora é fácil. É um texugo muito simpático .
































Tão simpático que até estava à espera do gnu. E, ainda que este quisesse voltar para terra dele, acabaram a almoçar uma apetitosa tagliatelle com espargos que o texugo estava a fazer. É o que acontece quando, às vezes, somos levados pelo vento e aterramos em lugares desconhecidos.


É a partir daqui que o livro também vai pelos ares e que vos convidamos a agarrar nos miúdos e a espreitarem o que acontece. Bem precisamos de ser levados para qualquer lado onde possamos encontrar gente simpática que nos receba com um delicioso almoço. E, não se iludam, esta não é uma história só para os mais pequenos. Como diz o Planeta, estes livros são para os primeiros leitores. Os bebés. Os que já não são bebés, mas há dias em que parecem. Os pequenos quase grandes. Os grandes ainda um bocado pequenos. Os mini com visão macro. Os macro que veem coisas micro. Os maiores, portanto! 
Ou seja, para vocês! Acrescentamos nós.




























Um dos nossos livros preferidos neste estranho 2020! Adoramos estas rajadas que, de vez em quando, sopram por aí! 

quarta-feira, 25 de novembro de 2020

O Que Vamos Construir. E se um livro por dia fôr uma vacina contra a pandemia?

6. O Que Vamos Construir, Planos Para Um Futuro Comum | Oliver Jeffers | Orfeu Negro

O Natal sem a chegada de um novo livro de Oliver Jeffers nunca seria igual. Há cerca de dois anos, falávamos aqui do fantástico  Aqui Estamos Nós, Apontamentos para Viver no Planeta Terra, um livro que o autor dedicava ao filho que acabara de nascer. Em jeito de continuidade, o livro que agora chega é dedicado à filha e constrói-se em torno da relação de ambos. Mas, com Jeffers, as coisas nunca são apenas o que parecem e, logo à chegada, somos confrontados com este pequeno texto: Só somos livres para sonhar e fazer planos (para o futuro) quando não temos de lutar para sobreviver (no presente). Para todos os pais e todas as filhas, nesta esfera, cujas hipóteses são menos promissoras do que as nossas, o nosso objetivo é nivelar o terreno. Com amor, Oliver e Mari 

(Em memória do Óscar e da Valeria, que tentaram sem nunca ter conseguido).

O que vão, então, construir pai e filha? Em primeiro lugar, uma história repleta de amor e de afectos, com que brindam os leitores. E que acaba por se revelar um espécie de passaporte para tantas viagens que pais e filhos sonham fazer. 













Com um texto rimado, a cada dupla página os nossos protagonistas surpreendem-nos com a diversidade de coisas fantásticas que constroem. Ou sonham construir. Uma porta, uma casa, um túnel para qualquer lugar ou  essa fabulosa estrada para a lua! 














Um sítio  onde chegar sem hora marcada, um abrigo onde guardar o que trazem de viagens passadas e o amor já reservado. Pelo meio, também há perigos e inimigos. Fazem parte da vida.  Nada que uma chávena de chá e uma boa dose de desculpas não consigam superar. Mas o que eles mais constroem são os laços e as cumplicidades que, certamente, os vão unir toda a vida.



Jeffers mantém-se fiel ao registo do anterior livro, sendo as semelhanças evidentes. Os elementos intertextuais passeiam-se no livro, exibindo, por vezes, alguma ordem caótica. Mas o que mais nos encanta neste livro é a viagem que convida os leitores de todas as idades a fazer.  Apanhem boleia na estrada para a lua, ou no túnel que vos leva a qualquer lado, ou descansem num sítio confortável... Inspirem-se com um pai e uma filha capazes de construir um super relógio para evitar o tempo morto e assim irem construindo o futuro um do outro.
Façam os vossos planos para um futuro comum. Sonhem juntos. Porque não há vírus que ataque o sonho.

terça-feira, 24 de novembro de 2020

Duas Casas. E se um livro por dia fôr uma vacina contra a pandemia?

 

5. Duas Casas, de  Pedro Saraiva e Anabela Dias | Imaginário do Gigante.

A dureza dos dias que vivemos tem virado do avesso as nossas rotinas e as nossas horas. A muitas famílias tem, mesmo, trazido dificuldades acrescidas. Falamos daquelas que partilham os dias dos filhos alternadamente e que, agora, nem sempre conseguem a sintonia desejada para gerir a vida das crianças entre duas casas. A nossa sugestão de hoje transporta um olhar poético de uma criança que vai colocando questões sobre a distância e as vivências das casas onde habitamos. O livro deu origem a uma peça de teatro com o mesmo nome, com marionetas e sombras, levado à cena pelo Imaginar do Gigante. A separação de um casal é o mote para uma história que nos faz sorrir muitas vezes e pensar muitas mais. Dividida em capítulos, sendo o primeiro o das incomunicações, apresenta uma estrutura bilingue com a página da esquerda contando a história em português e a da direita em inglês. Afinal, as casas também falam mais do que uma língua. De forma inteligente e harmoniosa, as ilustrações distendem-se por ambas as páginas, contando a mesma história, mas sem nunca se repetirem integralmente.


Ele e ela desarrumaram todas as gavetas que estavam juntas. Colocaram tudo à pressa em malas separadas. Depois, foram à procura de uma nova casa para morar. Mas as casas que procuramos, nem sempre nos encontram. E procurar uma casa no mundo é muita distância a percorrer.

E porque no mundo existem muitas casas, a busca nunca será fácil. Há casas que moram de dia e casas que moram de noite. Há as altas, as baixas e as assim-assim. As viradas para nascente e as viradas para poente, as bem arrumadas e as fora do sítio... Casas que moram sozinhas e casas que moram umas com as outras. Casas de graça e casas guardadas nos cofres dos bancos, casas com dono e donos sem casa... São muitos os tipos de casa que o leitor pode encontrar neste capítulo. O das casas constipadas e outras por constipar.








Capítulo novo: o princípio de todos os outros capítulos.  É aqui que o leitor fica a saber que há um lugar onde as casas nascem com música lá dentro. Pelas características enunciadas pela menina que nos conta a história, percebemos que estas são as casas que todos gostaríamos de habitar. O que ela mais gosta nas casas são os dias grandes. Porque nas casas dos dias grandes, todos podemos ser quem quisermos. Um castelo, um monstro, ou mesmo um sapo que beija príncipes a toda a hora. As casas onde os adultos não dizem nada  às crianças, quase nada...

Entre o capítulo dificuldade: contas difíceis e o capítulo prático: a correr, percebemos que há aviões que mudam as rotas. E que isso pode deixar as nuvens  aborrecidas por muito tempo... Sem preconceitos nem concessões, muitas são as questões que a menina vai equacionando.  O texto poético e com uma delicada dose de humor entrelaça-se na perfeição nas ilustrações de Dias. Com o seu jeito de menina sonhadora, a ilustradora consegue aqui um registo que transporta para a infância leitores de todas as idades.  Um livro que se transforma ele próprio numa casa onde todos queremos morar por algum tempo.

Não deixem de entrar em todas estas casas. Visitem-nas, habitem-nas ou deixem que elas vos habitem. Afinal, como diz esta criança, "o mais importante numa casa é o seu coração". E ela tem dois: a casa da mamã e a casa do papá. Viajar com ela entre casas, ouvir-lhe os pensamentos, adivinhar-lhe os desejos e encantarmo-nos com a força com que aceita a vida, é, nos dias que correm, um delicioso e imenso prazer. Bem vos dizemos que um livro por dia...




segunda-feira, 23 de novembro de 2020

Hipopómatos em Festa.


Viajamos através do único meio capaz de nos levar a qualquer lado, o LIVRO.

Foi assim que, há 9 anos, iniciámos este blogue. É assim que hoje continuamos a querer dar-vos boleia. Festejamos com vocês, sorteando 3 livros, gentilmente oferecidos pela editora Kalandraka. 

1. A Aranha Muito Ocupada, de Eric Carle

2. 29 Histórias Disparatadas, de Ursula Wolfel e Neus Bruguer

3. No Ovo, de Emma Lidia Squillari

Para se habilitarem basta que deixem aqui o vosso comentário (sobre o blogue ou sobre qualquer livro de que tenhamos falado este ano). O único requisito é que sejam seguidores.


Este é o resultado do sorteio (Random.Org).
Parabéns aos vencedores!
1. A Aranha Muito Ocupada, de Eric Carle, Antónia Estrela
2.29 Histórias Disparatadas, de Ursula Wolfel e Neus Bruguer - Celeste Silva
3. No Ovo, de Emma Lidia Squillari - Joana Marinho

sexta-feira, 20 de novembro de 2020

quinta-feira, 19 de novembro de 2020

Menino, Menina. E se ler um livro por dia fôr uma vacina contra a pandemia?

4. Menino, menina, de Joana Estrela | Planeta Tangerina

A estranheza dos dias que correm não se deve apenas à pandemia. O mundo parece atacado de  alguns "vírus" de índole diferente, assentes no ódio, na mentira, na maldade... Cada vez é mais urgente transmitir às nossas crianças os valores que alicerçam um mundo livre, justo e igualitário. Consolidá-los juntos. Quando um livro nos ajuda a fazê-lo, de forma simples e aberta, só podemos aplaudir. É o que acontece com o livro que escolhemos hoje, da autoria de Joana Estrela e editado pelo Planeta Tangerina, um lugar onde um livro nunca é só um livro. Começando por introduzir a questão da identidade, à medida que lhe vamos virando as páginas ele transforma-se numa celebração da diversidade, da liberdade, do respeito por cada um e por todos. 

As perguntas são lançadas. Algumas, já as ouvimos até à exaustão. Menino ou menina? Azul ou rosa? Calção ou vestido? Mas depois vêm as outras, as que nos fazem pensar. Precisas de saber se é rapariga ou rapaz? E se não é nem uma coisa nem outra?


Menino ou menina, rapariga ou rapaz, homem ou mulher? As perguntas pedem reflexão. Poderá aquilo que somos ser assim tão redutor? Não seremos todos  a soma de muito mais do que isso? A autora acompanha-nos. A espaços, vai deixando a sua opinião. Num registo puro e genuíno, com que os seus leitores rapidamente se identificam.

Um registo que se estende às ilustrações. Estrela já nos habituou ao seu traço de menina onde os mais novos facilmente se revêem e que continua a encantar os leitores mais crescidos. Dono de  uma boa dose de sensibilidade e algum humor, este é um livro para entrar de mãos dadas com a pequenada. Dito de outra forma, é uma lufada de ar fresco  de que bem precisamos. 



 
Menino ou menina? E se não é nem uma coisa nem outra? Uma coisa parece certa. A resposta não está debaixo da roupa.

quarta-feira, 18 de novembro de 2020

Espera, Miyuki. E se ler um livro por dia fôr uma vacina contra a pandemia?

3. Espera, Miyuki de Roxane  Marie Galliez e Seng Soun Ratanavanh | Orfeu Negro

Nunca a palavra paciência nos pesou tanto como nestes dias intermináveis que vivemos. Às vezes, pensamos que se nos pedissem para formular um desejo, pediríamos que fossem inauguradas fábricas de paciência. Uma vez abertas, agarrávamos nas nossas crianças e íamos buscar as doses necessárias. Porque são elas, as crianças, quem mais precisa.
O livro que hoje escolhemos não podia ter chegado em momento mais oportuno, já que esta temática se tornou recorrente com os mais pequenos. 
A pequena Miyuki não vê a hora de ir lá para fora festejar a chegada da primavera. Apressa o avô, não entendendo porque, numa data tão importante, o dia despertou primeiro que ele. O avô não tem essa pressa, sabe que o dia é grande... Mas, Miyuki quer a sua companhia não só para saudar a chegada da nova estação, como também para se despedir do último luar de inverno.  Os dois acabam indo jardim fora, envoltos num espectáculo de cores, dando os bons dias às cerejeiras e a todas as flores com que se cruzam.







Miyuki, atenta a todos os detalhes de um dia tão importante, não pode deixar de reparar numa pequena flor, que tal como o avô, parecia não ter pressa em despertar. Não era possível que não desabrochasse a horas de saudar a primavera. O sábio avô bem lhe explicou que nem todas flores dançam ao mesmo tempo. Que, por ser mais frágil e preciosa, aquela aguardava a água mais pura... Mas a impaciência da pequena não se compadecia com tanta explicação e antes mesmo do avô acabar, já ela andava à procura de água para a pequena flor.








































Miyuki não mediu esforços  na sua busca.  Um poço seco, uma nuvem vaidosa e presumida, uma cascata, um rapaz... Falou com todos, mas as palavras "agora" e "já", que  evidenciavam a sua impaciência  e alguns percalços próprios da pressa, impediram  que alcançasse o que procurava. 
Sem água para a pequena flor, a menina só voltaria a casa no dia seguinte, trazida pelo rio.
Às vezes é melhor ir devagar, dissera-lhe ele. 







































Com um final delicioso, este é um livro onde a poesia atravessa texto e imagens. Celebrando a cultura japonesa, os alegres e elegantes padrões florais pintados em tons vermelhos, verdes e amarelos são um festim para os olhos. Objectos como o quimono ou o fabuloso cisne de origami não deixam dúvidas ao leitor sobre os magníficos lugares que visita. 
Agarrem nas crianças, que facilmente se identificarão com Miyuki, e passeiem-se, pacientemente,  por este lugar encantado onde se cultiva a arte de saber esperar. 
Não nos cansamos de vos dizer que um livro por dia pode bem ser uma vacina contra a pandemia.


terça-feira, 17 de novembro de 2020

Grandes Amigos. E se ler um livro por dia fôr uma vacina contra a pandemia?

 
2. Grandes Amigos, de Linda Sarah e Benji Davies | Orfeu Negro

A nossa sugestão de hoje recai sobre a história do Zé e do Nico,  dois pequenos rapazes que partilham a amizade e as caixas de cartão. Sim, porque às crianças basta uma simples caixa para conseguirem ser o que quiserem. Reis, soldados, astronautas, piratas... Todos os dias, os dois sobem ao Monte do Cimo e dão asas à imaginação. Os dias são grandes, as brincadeiras muitas e eles conseguem ser um pouco de tudo o que lhes apetece. Correm, saltam, voam, conversam, riem e até ficam em silêncio. Gostam tanto que até se sentem grandes, como Reis Grandes. Mas o que são sempre é grandes amigos. O Zé adora estas brincadeiras a dois.

Um dia, um pequeno rapazinho que há algum tempo os observava, decidiu arranjar coragem para aparecer com a sua caixa de cartão e perguntar se podia juntar-se à brincadeira. O Gui era pequeno mas destemido. E o Nico nem hesitou. Claro que sim, era mais um para brincar. Podiam continuar a ser caçadores de dragões, acrobatas de arranha-céus... e amigos.
Mas o Zé não achou grande piada. As brincadeiras a dois eram fantásticas. Agora havia um intruso. Sentia-se tão estranho que deixou mesmo de ir ao Monte do Cimo. Apesar das muitas saudades que tinha do Nico e das fabulosas brincadeiras, o Zé optava por ficar em casa, metido com os seus desenhos. De vez em quando o Nico e o Gui batiam-lhe à porta... mas sem resultados. O Zé até já tinha destruído a sua caixa de cartão. Mas os amigos não desistem e um dia bateram-lhe à porta, sem intenção de zarpar dali. Tinham feito uma coisa para ele! 

O Zé não queria acreditar no que os olhos viam... Não, não era possível resistir à Criatura Monstruosa de Cartão! Ninguém resistiria. Nem nós, leitores! E podemos garantir que, depois desta íncrível obra de Benji Davies, ninguém mais se atreverá a deitar fora uma só caixa, uma só caixinha! 
Todos conhecemos as fragilidades e inseguranças da amizade nesta idade. De uma forma ou de outra, todos experienciámos alguns destes sobressaltos num tempo em que fomos meninos. Os pais têm, muitas vezes, que lidar com as tristezas e os medos relativos ao  amigo "que já não é meu amigo"ou que alterou o lugar do seu filho no ranking das preferências... Mas essas são coisas que fazem parte do processo de crescimento. A amizade e a partilha são aprendizagens sempre em construção. 

Sarah e Davies fazem uma deliciosa abordagem desta temática. Benji Davies, de quem já falámos aqui muitas vezes, tornou-se um autor querido dos leitores portugueses. A Baleia, Nina, O Olharapo, A Ilha do Avô são alguns exemplos de livros publicados pela Orfeu Negro que já lhe granjearam leitores incondicionais. E nesta parceria continua a encantar-nos.
Quanto aos petizes, sempre adiantamos que  os amigos já são três e continuam a passar os dias no Monte do Cimo. Só que agora com essa fabulosa invenção que é a Criatura Monstruosa de Cartão ou como eles lhe chamam, O Grande Escala-Forte.


Queridos leitores, guardem as caixas todas aí por casa, abram o livro e façam coisas com as crianças! 
Depois, é só voar. O tédio não entra nesta brincadeira. 
Bem vos dizemos que um livro por dia pode bem ser uma vacina contra a pandemia.




segunda-feira, 16 de novembro de 2020

O Bolero de Ravel. E se ler um livro por dia fôr uma vacina contra a pandemia?

Não somos cientistas, mas acreditamos que ler um livro por dia pode ser uma vacina contra a pandemia. Escolher o lugar e o tempo certos para viajar à boleia de um livro é um acto de sanidade mental. É um conforto para o corpo e um aconchego para a alma. Em dias de confinamento, ler com e para as crianças é levá-las a passear. Entre histórias, percorrem outros lugares, conhecem outras vidas, habitam novos mundos. Dito de outra forma, saem de casa. 
Para os que não são praticantes e se atrevam a experimentar, este pode tornar-se um novo hábito para amenizar os dias estranhos e pesados que vivemos. Os que já são leitores, conhecem bem as vantagens da receita. Em jeito de calendário adventício antecipado, uma vez que o nosso é sempre feito de livros, deixaremos aqui, até ao Natal, uma sugestão diária de leitura. Com as nossas ou outras sugestões, este Natal, escolham livros. Visitem uma livraria independente perto de vocês e ofereçam livros. A miúdos e graúdos. Boas leituras! 
1. O Bolero de Ravel, de José Antonio Abad Varela e Federico Delicado | edição Kalandraka.

Composto em 1928, a pedido da bailarina russa Ida Rubinstein, o Bolero tornar-se-ia a obra mais famosa do compositor francês Maurice Ravel. Ao contrário do que poderia pensar-se, por se tratar de uma música repetitiva e exclusiva para orquestra, a fama e a popularidade uniram-se em torno da obra. 


Música, maestro! Ponham o Bolero de Ravel a tocar. Entrem na vila onde a orquestra convidada se prepara para atuar e deliciem-se com o espectáculo. Os músicos acabaram de chegar e estão por todo o lado. Como uma delicada e bela partitura, cada página apresenta-nos um instrumento e os seus músicos. Mas esta não é uma orquestra qualquer. A escolha dos protagonistas recai sobre animais oriundos de algumas espécies ameaçadas de extinção. Delicado humanizou-os e desenhou-os de forma imaculada. Texto e ilustrações convergem numa desconcertante e tocante harmonia, proporcionando aos leitores um concerto inesquecível.


Delicado, cujo livro mais conhecido entre nós é Ícaro, obra vencedora do VII Prémio Internacional Compostela para Álbuns Ilustrados, é um daqueles artistas de quem costumamos dizer que pintam os silêncios e nos envolvem na sua musicalidade com absoluta magia. Em O Bolero de Ravel, música e silêncios respeitam-se com uma mestria capaz de nos fazer ouvir o timbre da cada um dos instrumentos, numa magistral orquestração.





Um livro que se revela um sóbrio festim de cores e luz que irradiam de cada recanto da vila.  Este é um concerto que, seguramente, vai deslumbrar leitores de todas as idades. Não imaginamos melhor forma de iniciar as crianças na aprendizagem dos instrumentos musicais de uma orquestra, nem de a música vos entrar em casa este Natal. Não deixem a orquestra partir sem dançar ao ritmo do Bolero. Não deixem de fazer parte. Repetimos, de um concerto único e inesquecível.



 Num ano tão negro, esta é, indiscutivelmente, uma das escolhas dos Hipopómatos.


sábado, 14 de novembro de 2020

sábado, 7 de novembro de 2020

quarta-feira, 4 de novembro de 2020

Capitão Rosalie


Pequeno e delicado no formato, mas grande e intenso no conteúdo. É assim Capitão Rosalie, um livro que fala de morte, de força, de resistência, de coragem, de perseverança, de amor, de amizade, de solidariedade. É uma história em tempos de guerra.
Com texto do premiado autor francês Timothée de Fombelle e ilustrações da não menos premiada canadiana Isabelle Arsenault, o livro foi recentemente trazido para Portugal pela Orfeu Negro.


A história é contada na primeira pessoa. Rosalie, uma menina de cinco anos e meio, transporta-nos para o ano de 1917, em plena Grande Guerra. O pai  partiu para combater e a mãe passou a trabalhar na fábrica. Apesar da idade, a pequena passa o dia na escola dos mais crescidos. Foi um pedido da mãe e o professor, também ele um veterano de guerra, deixou que ali passasse o tempo. Fora de cena quem não é de cena, a Rosalie foi reservado um lugar ao fundo da sala, um caderno para desenhar e a invisibilidade própria de quem não pertence ali. Mas ela não se importou. Porque tem um plano secreto, uma missão para cumprir e ninguém pode desconfiar. Nem mesmo o professor. Só ela sabe que tudo não passa de um disfarce que lhe permite, ao mesmo tempo,  traçar o plano e espiar o inimigo. Capitão Rosalie sonha com o dia em que receberá a medalha. 


Rosalie partilha com os leitores a existência do seu plano secreto, mas em momento algum nos diz em que consiste. Uma história narrada de forma intensa e poderosa, que faz com que o conhecimento do leitor cresça apenas na medida do que a protagonista vai revelando. Em casa, a acção centraliza-se na leitura que a mãe lhe faz das cartas que vão chegando do pai. Ainda que possamos começar a suspeitar que a tristeza vai bater àquela porta, a interrogação acompanha-nos até final. Que missão tem Rosalie? De que forma a vai executar?


Com o plano já em marcha, o leitor é tão surpreendido quanto a multidão que anda à procura da menina. O professor, os colegas mais velhos, a mãe... Todos descobrimos que Rosalie tinha, afinal, como missão aprender a ler. Agora que já sabe, procura a verdade. A menina fica a saber que as leituras que a mãe lhe fazia das cartas do pai não correspondiam ao seu teor, mas apenas a um desejo de a poupar à crueldade da vida no campo de batalha. Rosalie leu, também, a carta que mais procurava. A do envelope azul. Aquela que, quando chegara, arrancara o sorriso dos lábios da mãe e a fazia suspeitar que a vida nunca mais seria igual. Capitão Rosalie recebeu a medalha, mas não aquela que sonhara. Essa, somos nós, leitores, que lha damos. 

Uma história tocante, contada de forma exemplar e ilustrada com mestria, que se transforma num pequeno grande tesouro. Uma viagem que nos faz viver um pedaço de história dentro da história. Bem ao seu jeito, Arsenault faz-nos deambular pelos cenários da época, tanto exteriores como interiores, com refinada delicadeza. 
Com algumas dezenas de livros ilustrados, como Virginia Wolf, Jane, The Fox, And Me, ou You Belong Here, Arsenault faz a sua terceira incursão entre nós num curto espaço de tempo. Mas Porquê? e A Abelha foram as duas anteriores escolhas da Orfeu Negro. Nós, que somos fãs da sua obra, agradecemos e já aguardamos o próximo.