terça-feira, 24 de novembro de 2020

Duas Casas. E se um livro por dia fôr uma vacina contra a pandemia?

 

5. Duas Casas, de  Pedro Saraiva e Anabela Dias | Imaginário do Gigante.

A dureza dos dias que vivemos tem virado do avesso as nossas rotinas e as nossas horas. A muitas famílias tem, mesmo, trazido dificuldades acrescidas. Falamos daquelas que partilham os dias dos filhos alternadamente e que, agora, nem sempre conseguem a sintonia desejada para gerir a vida das crianças entre duas casas. A nossa sugestão de hoje transporta um olhar poético de uma criança que vai colocando questões sobre a distância e as vivências das casas onde habitamos. O livro deu origem a uma peça de teatro com o mesmo nome, com marionetas e sombras, levado à cena pelo Imaginar do Gigante. A separação de um casal é o mote para uma história que nos faz sorrir muitas vezes e pensar muitas mais. Dividida em capítulos, sendo o primeiro o das incomunicações, apresenta uma estrutura bilingue com a página da esquerda contando a história em português e a da direita em inglês. Afinal, as casas também falam mais do que uma língua. De forma inteligente e harmoniosa, as ilustrações distendem-se por ambas as páginas, contando a mesma história, mas sem nunca se repetirem integralmente.


Ele e ela desarrumaram todas as gavetas que estavam juntas. Colocaram tudo à pressa em malas separadas. Depois, foram à procura de uma nova casa para morar. Mas as casas que procuramos, nem sempre nos encontram. E procurar uma casa no mundo é muita distância a percorrer.

E porque no mundo existem muitas casas, a busca nunca será fácil. Há casas que moram de dia e casas que moram de noite. Há as altas, as baixas e as assim-assim. As viradas para nascente e as viradas para poente, as bem arrumadas e as fora do sítio... Casas que moram sozinhas e casas que moram umas com as outras. Casas de graça e casas guardadas nos cofres dos bancos, casas com dono e donos sem casa... São muitos os tipos de casa que o leitor pode encontrar neste capítulo. O das casas constipadas e outras por constipar.








Capítulo novo: o princípio de todos os outros capítulos.  É aqui que o leitor fica a saber que há um lugar onde as casas nascem com música lá dentro. Pelas características enunciadas pela menina que nos conta a história, percebemos que estas são as casas que todos gostaríamos de habitar. O que ela mais gosta nas casas são os dias grandes. Porque nas casas dos dias grandes, todos podemos ser quem quisermos. Um castelo, um monstro, ou mesmo um sapo que beija príncipes a toda a hora. As casas onde os adultos não dizem nada  às crianças, quase nada...

Entre o capítulo dificuldade: contas difíceis e o capítulo prático: a correr, percebemos que há aviões que mudam as rotas. E que isso pode deixar as nuvens  aborrecidas por muito tempo... Sem preconceitos nem concessões, muitas são as questões que a menina vai equacionando.  O texto poético e com uma delicada dose de humor entrelaça-se na perfeição nas ilustrações de Dias. Com o seu jeito de menina sonhadora, a ilustradora consegue aqui um registo que transporta para a infância leitores de todas as idades.  Um livro que se transforma ele próprio numa casa onde todos queremos morar por algum tempo.

Não deixem de entrar em todas estas casas. Visitem-nas, habitem-nas ou deixem que elas vos habitem. Afinal, como diz esta criança, "o mais importante numa casa é o seu coração". E ela tem dois: a casa da mamã e a casa do papá. Viajar com ela entre casas, ouvir-lhe os pensamentos, adivinhar-lhe os desejos e encantarmo-nos com a força com que aceita a vida, é, nos dias que correm, um delicioso e imenso prazer. Bem vos dizemos que um livro por dia...




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