sexta-feira, 10 de julho de 2020

Era Duas Vezes o Barão Lamberto.




“O homem cujo nome é pronunciado permanece vivo”.  

No ano do centenário do nascimento de Gianni Rodari, esta podia bem ser uma referência ao autor, tantas são as vezes que lhe pronunciamos o nome. O Pai da Gramática da Fantasia permanece vivo através do extraordinário legado que nos deixou.
A frase é sua e revela-se o mote para um dos mais magníficos e hilariantes contos que escreveu, já com estatuto de clássico na literatura infantojuvenil. Era Duas Vezes o Barão Lamberto, editado recentemente pela Kalandraka, chega em formato de luxo, com ilustrações do conceituado Javier Zabala (de quem falámos aqui e aqui). Antes, o espanhol já tinha deixado a sua assinatura no delicioso conto de Rodari, El Hombre Que Compró La Ciudad de Estocolmo.


Rodari foi, na sua essência, um brincador das palavras, um descobridor dos seus múltiplos sentidos e um criativo na arte de as pôr ao serviço das crianças. Grande pedagogo, revelou-se, também, exímio nos método de contagiar os adultos. Com ele aprendemos que as palavras são, afinal, brinquedos. É com estes brinquedos que podemos exercitar o maravilhoso poder de inventar.
Em Era Duas Vezes o Barão Lamberto, esse poder não parece conhecer limites. O Barão é um homem muito velho, muito rico e detentor, nada mais nada menos, de 24 doenças. Arteriosclerose, artrite, artrose, asma, bronquite crónica... De a a z, Lamberto padece de tudo um pouco. É o que dá ter a mania das grandezas. Anselmo, o velho mordomo com quem partilha a casa e a vida, anota tudo. Os remédios, as horas, o que pode comer, o que pode beber... Para além das 24 doenças, Lamberto tem também 24 bancos e outras tantas casas espalhadas pelo mundo. Quando chega o Inverno, os velhos ossos do Barão têm por hábito ir apanhar o sol do Egipto. É lá que se dá o encontro com o curandeiro árabe que lhes fornece a cura para todos os males do velho. “O homem cujo nome é pronunciado permanece vivo”.  




O segredo guarda-se no sótão, onde passam a viver umas quantas criaturas contratadas exclusivamente para invocar, dia e noite, o santo nome: - Lamberto, Lamberto, Lamberto...
O humor e a criatividade que atravessam a obra rodariana são aqui uma constante, a que se juntam a crítica social, a fina ironia e uma boa dose de sarcasmo. Com a inteligência a que nos habituou, a brincadeira percorre temas tão variados e sérios como o materialismo, a ganância ou os direitos dos trabalhadores.
Pelo meio, há um desfile de personagens que, por uma razão ou por outra, nos são familiares. É o caso de Otávio, o sobrinho protótipo do escroque que anseia a morte do tio  para herdar a grande fortuna ou dos 24 bandidos, todos de nome Lamberto, que exigem 24 milhões da fortuna do velho barão.



Ao longo da história, Lamberto rejuvenesce, morre, ressuscita e termina criança. Mas, reparem caros leitores, que, se o fim escolhido não for do vosso agrado, o autor vos dá total liberdade para inventar outro. Afinal, falamos de Gianni Rodari

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