terça-feira, 20 de dezembro de 2022

Esperando o Amanhecer

 Livros para ler antes de 2022 desaparecer.




















Esperando o Amanhecer | Fabiola Anchorena| Kalandraka

O amanhecer tarda em chegar. A floresta apresenta-se pintada de preto há demasiado tempo. Os animais não entendem a razão do sol tardar em chegar. Há rumores de que possa estar escondido nas profundezas da floresta. Mas todos precisam dele para retomar o normal curso do dia. 
















São animais de todas as espécies e anseiam a chegada do sol, do novo dia. Subitamente, um clarão ao fundo da floresta leva-os a pensar que aquele despertou. Sentem o seu intenso calor. Vão na sua direcção. Mas, rapidamente, percebem que não se trata do sol. A cor assemelha-se, mas aquilo não os aquece, queima-os. São as labaredas de um incêndio. 


Ameaçados, todos fogem. Têm medo. Lutam pela sobrevivência. A catástrofe vivida pelos animais é algo de real a que todos já assistimos. Uns sobrevivem. Outros não. Finda a tragédia, o dia acaba por despertar. Os habitantes são menos e a floresta é, agora, outra. À nossa semelhança também eles têm a esperança de que o novo dia traga um futuro mais promissor, sem ameaças e sem tragédias que ponham em perigo o seu habitat e forma de vida.








Obra vencedora do XV Prémio Internacional de Compostela, nas palavras da autora peruana, este foi um projeto nascido da incerteza e da angústia sentidas quando, em 2019, a Amazónia ardia e se debatia com um dos piores incêndios de que há notícia. No mesmo ano, a Austrália viu-se devastada com um incêndio florestal de grandes dimensões. Mais tarde, a catástrofe atingiu grande parte da Europa. Anchorena agradece ainda às comunidades nativas dos povos indígenas do Peru que cuidam da conservação e vigilância das florestas, reconhecendo o seu importante papel no país.













Esperando o Amanhecer é um dos livros que marcam 2022. Os seus destinatários não têm idade. Porque é urgente que todos tenham consciência do que não pode acontecer nesta e em todas as florestas.


domingo, 11 de dezembro de 2022

A Inundação

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A Inundação | Mariajo Ilustrajo | Fábula


A cidade acorda molhada, mas a maioria dos habitantes não dá grande importância ao facto. Talvez por ser verão. Todos continuam a fazer a sua vida normal, ocupados com as coisas de todos os dias. Aos poucos, o que parecia insignificante vai transformar-se num grande problema.






Uma cidade exclusivamente habitada por animais é o cenário escolhido para esta história. Só os personagens são diferentes, porque os hábitos de vida e o ritmo frenético são iguais aos de qualquer outra cidade. Casas, escolas, locais de trabalho, restaurantes, museus... o leitor entra em todo o lado. Ao mesmo tempo, é como se lhe estivesse reservado o papel de fazer a sondagem da opinião pública sobre o acontecimento do dia. Todos os animais têm opinião. A maioria desvaloriza. Há mesmo quem  considere refrescante e divertido passear de galochas pela cidade.















Mas a água não para de aumentar. A cada dupla página, o azul rouba espaço aos tons preto e branco com que inteligentemente a cidade foi pintada. O azul apodera-se da cidade, mas afecta os habitantes de forma diferente. Os mais pequenos são, obviamente, os primeiros a ser atingidos. Os mais altos parecem continuar indiferentes. O leitor não tem dúvidas, trata-se de uma inundação.
























Numa narrativa predominantemente visual, aos tons preto e branco que dividem o espaço com o azul da água, junta-se apenas um apontamento amarelo que percorre todo o livro. É a cauda de um pequeno habitante que, desde o inicio, está consciente do problema e tenta alertar para ele. Só com o decurso do tempo e a subida do nível da água, consegue que todos acabem por perceber que é necessário fazer alguma coisa. E que só em conjunto conseguirão solucionar o problema. 










Juntos somos mais fortes é o lema desta deliciosa história com uma temática bem actual. Uma história onde miúdos e graúdos podem permanecer horas a  fio, descobrindo uma parafernália de elementos e de referências culturais. Sendo este o livro de estreia da ilustradora espanhola, ficamos com água na boca à espera do próximo.

sábado, 10 de dezembro de 2022

segunda-feira, 5 de dezembro de 2022

A Casa Suspensa nas Árvores

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A Casa Suspensa nas Árvores | Ted Kooser e Jon Klassen | Orfeu Negro

"Não muito longe daqui, vi uma casa suspensa nas mãos das árvores. Esta é a sua história."

Kooser é um poeta laureado que, de quando em vez, faz umas incursões pelo universo dos mais novos. O tom poético da sua escrita e a forma como entrelaça as palavras oferecem ao leitor uma história onde  o tempo e o espaço se unem numa intimidade única. As ilustrações de Klassen, no estilo minimalista a que já nos habituou, parecem perpetuar o isolamento e os silêncios vividos na história.











A imagem da casa no meio de um descampado marca o inicio da narrativa. Duas crianças  correm em direcção aos frondosos bosques vizinhos que abrigam toda a espécie de árvores. É lá que se situam os lugares secretos onde brincam na companhia dos pássaros. Por vezes, ficam apenas a observar o pai, que teima em aparar o relvado impedindo que qualquer semente ali possa germinar. Mesmo depois de um dia de trabalho, o homem ocupa o tempo a arrancar os rebentos que, ciclicamente, ali crescem trazidos pelo vento e pela chegada do outono.












Os anos foram passando. O pai foi envelhecendo. As crianças são, agora, um homem e uma mulher aptos a enfrentar o mundo. A proximidade do momento em que sairão de casa adensa a obsessão do solitário pai pelo perfeição do relvado. O envelhecimento do homem é acompanhado pelo da casa. A solidão é apreendida pelo leitor, quer através das palavras do poeta, quer pela sobriedade das ilustrações. 













A idade não perdoa e o pai sabe que aparar aquele relvado já não é para ele. O homem acaba por ceder e muda-se para a cidade, para mais perto dos filhos. A casa é posta à venda, mas o árido descampado não atrai compradores. Com o decurso do tempo, até ele acaba por deixar de ir até lá. 











Cada vez mais velha, sem tinta, sem telhas, sem vidros, só a mãe natureza se interessa por ela. Curiosamente, numa casa onde, por omissão, o leitor sempre soube que não havia uma mãe. Os pardais escolhem-na para fazer o ninho e as sementes já não têm quem as impeça de crescer. São elas, as jovens árvores que tinham começado a crescer, que abraçam agora o que resta da casa.