sábado, 24 de fevereiro de 2018

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018

Um Capuchinho Vermelho



Sim, coleccionamos Capuchinhos. Vermelhos, verdes, cinzentos, amarelos... São muitos e não caberiam todos numa foto, mas partilhamo-los todos os dias na Casa dos Hipopómatos. Agora acrescentámos  a versão portuguesa de Um Capuchinho Vermelho, de Marjolaine Leray,  recentemente editada pela Orfeu Negro.

O confronto inicial? Um provocatório  estás no papo versus nem te estou a ver.

Um pequeno livro, a dois tons, onde os  criativos e geniais desenhos, em jeito de rabiscos, metem frente a frente um lobo alto e angular e um pequeno capuchinho que mais parece feito de uma linha só. Vislumbramos-lhe uns palititos como pernas e braços. As feições são modeladas por um simples  traço no lugar do nariz.

Ui, que personalidade! Esta vai dar luta!

Apesar da desproporção, uma simples interjeição é suficiente para o leitor perceber que o lobo tem pela frente um osso duro de roer.  Aqui não há lamechices, medos ou justificações. A história existe há tempo suficiente para que ambas as personagens saibam ao que vão. 


Não há concessões. Sim, sabemos que vai para casa da avó, mas esta não chega sequer a ser chamada à história. Capuchinho chega e sobra para o Lobo. Este não perde tempo e anuncia cedo ao que vai. A colocação do guardanapo à volta do pescoço é elucidativa das suas intenções. A sarcástica  interrogação de Capuchinho deixa adivinhar a toada de humor que caracteriza a história de Leray.

Vamos comer?

O minimalismo dos desenhos estende-se ao texto. Os diálogos são curtos e directos. O seu a seu dono: as falas do lobo são a preto e tudo o que sai da boca do capuchinho, sai a vermelho. 


A partir daqui, o diálogo assenta na estrutura tradicional, mas não a segue. Os olhos grandes, os dentes... Capuchinho não cai na esparrela. Não pergunta, constata!

Oh, quanto atrevimento!

E quando o tonto lobo lança mão da velha e gasta resposta "são para te comer melhor", segue-se o desconcertante não


Capuchinho sabia ao que ia. Entrou na história munida de tudo o que precisava. Tanto e tão pouco. Menina inteligente. A esta altura, as gargalhadas são mais que muitas. Miúdos e graúdos estão rendidos a este ser minúsculo que se apresenta quase sempre de perfil. Dizemos quase, porque na hora do não e da vitória a postura é outra.


Aqui, a intensidade ardilosa está do lado do Capuchinho. O leitor já não tem dúvidas, o lobo está no papo. A propósito, lembramo-nos sempre de uma das vezes que contámos a história aos nossos meninos. Chegados a este ponto, um deles, contagiado pela coragem da personagem, interrompeu-nos dirigindo-se ao lobo: Olha, vai mas é lavar os dentes!


Um final subversivo? Claro, o lobo foi completamente papado! Com uma subtileza e inteligência fabulosas, diga-se! Verdadeiramente hilariante, este é um dos livros de que mais gostamos dos muitos que conhecemos sobre o conto das mil e uma versões.


Há uns anos, adquirimos a versão em espanhol, que já contámos vezes sem conta. Agora, estamos radiantes e gratos à Orfeu Negro. Ingénuo em português... tem outro sabor! Coleccionando ou não Capuchinhos, não percam tempo. Abram o livro. Capuchinhos Vermelhos há muitos, mas este é único!


sábado, 17 de fevereiro de 2018

Ivo Neto, Arquiteto.


O protagonista desta história é um daqueles rapazes para quem a pergunta "o que queres ser quando fores grande?" não oferece hesitações. Ivo Neto nasceu para ser arquitecto.


O pequeno ainda nem ia à escola e assim, de repente, já tinha criado uma torre surpreendente feita de fraldas e cola. A construção, a relembrar a Torre de Pisa, era de tal modo fascinante que deixou a mãe radiante. Antes de saber, claro, que era feita de fraldas usadas.


Entre esfinges de terra no jardim da vizinhança, arcos de crepes e gelado, monumentos feitos de fruta, certo é que, aos três anos de idade, o pequeno já obtivera o reconhecimento parental da sua genialidade.


Com tanto aplauso e louvor, o pequeno Ivo estaria longe de supor que o pior estava para vir. Na verdade, os  problemas bateram-lhe à porta  assim que chegou à escola.
                                                                    NADA DE PRÉDIOS!  
Temos muito que fazer, muita coisa para aprender - era o discurso de Dona Pilar, a autoritária professora que quase destruía o que Ivo vinha erguendo, o seu sonho.


É certo que a Dona Pilar tinha as suas razões para tamanho pavor, já que, com apenas sete anos, ficara presa num elevador. De um prédio altíssimo e famosíssimo... Mas isso não justificava cortar as asas ao rapaz. 
A escola era como uma gaiola. O  sonho de Ivo não parecia caber lá dentro.  E o pequeno, numa tristeza só, pensava " Se não posso construir, o melhor é eu fugir".


Felizmente, um dia tudo mudou. Num passeio escolar a uma pequena ilha perdida no meio do rio, eis que um pontão decide desabar. Ivo Neto, o nosso arquiteto, sem pestanejar, construiu logo ali uma ponte suspensa para que todos pudessem regressar.


Com uma boa dose de humor, as ilustrações de David Roberts vão revelando ao leitor réplicas de alguns monumentos e edifícios bem conhecidos, como é o caso da ponte de São Francisco, onde não faltam os metros e a data da inauguração. Hilariante é o momento em que, em cima da ponte, Dona Pilar abre a mente para um novo horizonteRoberts é um versátil ilustrador, de quem sempre lembramos as fantásticas ilustrações a preto e branco ( bem ao jeito de Edward Gorey)  dos contos de terror escritos por Chris PriestleyO texto de Andrea Beaty,  escrito em verso, cativa os mais pequenos que ouvem a história vezes sem conta, ficando com uma imensa vontade de arquitetar. 




Editado pela Caminho,  o livro deixa-nos à espera do próximo, uma vez que a dupla conta com vários livros.
E sim, aqui a história acaba bem. Ivo Neto, arquiteto, continua a sonhar. Mas, senhores professores, esta história dá que pensar. Nem sempre há por perto um pontão em risco de desabar.

domingo, 4 de fevereiro de 2018

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

Devia Haver Por Aí Mais Tigres No Jardim


Às vezes, as crianças também se aborrecem. Em casa da avó,  rodeada de brinquedos e de livros, Nora não esconde que está cansada de pintar tigres . Ela e Rafa, a sua girafa.


A  sugestão da avó é que troque o papel e as canetas pela brincadeira no jardim.  Até porque, por falar em tigres, a avó pensa ter visto um no jardim. Incitada a explorar o jardim, Nora mostra-se pouco convencida, invocando já não ter idade para essas tontices.


A avó, essa, não desarma. Libelinhas do tamanho de pássaros, plantas carnívoras, um urso - polar tão rabugento quanto bom pescador,  há de tudo no seu jardim! Mas  o máximo, é mesmo o tigre.



Com uma paleta de cores alegres e vivas,  as ilustrações de Lizzy Stewart mostram um jardim encantador, ao contrário da descrição que a pequena dele tinha feito. É por entre as múltiplas tonalidades de verde que por ali deambulamos com Nora e a sua girafa, testemunhando a sua crescente surpresa.


Oh, afinal, até há libelinhas do tamanho de pássaros. Mas um tigre? Impossível. Plantas que nos conseguem engolir de um trago? Pode ser. Mas um tigre? E, já agora, se por acaso, mero acaso, nos cruzarmos com um tigre no jardim, como podemos ter certeza que ele é real? Com um final hilariante, a história cativa os mais pequenos, deixando-os de olhos esbugalhados  à porta dessa grande fábrica de jogos e de brincadeiras  que é a imaginação.


Distinguido com o Prémio Waterstones para Melhor Livro Ilustrado, Há Um Tigre no Jardim, da britânica Lizzy Stewart, chegou recentemente a Portugal pela mão da Fábula, uma chancela da 20|20 Editora.